A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” realizou audiência pública para tratar da imprensa de resistência católica. Identificado como filo comunista subversivo, o jornal O São Paulo teve edições apreendidas e chegou a ser fechado pelos agentes da censura ditatorial, revelou o bispo Dom Angélico Sândalo Bernadino, durante sessão realizada nesta quarta-feira (23/10).
“As pastorais da periferia tiveram papel de destaque. As publicações posicionavam-se contra a censura, incentivando a união e organização do povo, denunciando a tortura [e outros abusos] da ditadura militar (1964-1985). O jornal O São Paulo sofreu censura prévia e resistiu a essa censura, sobretudo nos anos de 1971 – 1978”, relatou Angélico.
Os comunicados anunciando a censura eram sempre feitos por telefone até que no dia 26 de julho de 1976 chegou por escrito uma carta da censura prévia. Todo o conteúdo como fotografias, textos, vinhetas, a capa, ficou submetido aos censores da sede da Polícia Federal. Após a censura, ainda exigiram que fossem preenchidos os espaços em branco ou o editor teria que diminuir o número de páginas, conforme explicou Dom Angélico.
Após a impressão do semanário, três publicações deveriam ser enviadas. No espaço em branco, escreveram: – Leia e divulgue O São Paulo.Além da censura, o jornal O São Paulo teve edições falsificadas. Um número do jornal o São Paulo na semana de 20 a 26 de agosto de 1982.
A matéria principal colocou na capa uma foto de Dom Paulo Evaristo Arns com o título “Mea Culpa”, insinuando que o religioso estaria arrependido da sua atuação incisiva nas denúncias contra a violência perpetrada na época. “A edição foi distribuída em todas as paróquias da arquidiocese de São Paulo”, contou Dom Angélico.
Grita Povo
O jornal O São Paulo atravessou a Ditadura e continua saindo periodicamente. O jornalista Gilberto Nascimento que concluiu o curso de jornalismo nos anos 1980, contou como se dava a sua contribuição no jornal ao lado do fotógrafo Douglas Mansur. “Fizemos reportagens sobre situação de opressão e miséria do povo”, destacou Nascimento.
Havia também o jornal Grita Povo, que seguia a mesma linha de denúncias. “O Grita Povo era um instrumento pedagógico. [Após ser publicado] o jornal era usado em reuniões e fazíamos o trabalho sobre o papel da comunicação no meio da comunidade”, explicou Douglas Mansur.
O presidente da Comissão “Rubens Paiva”, Adriano Diogo, destacou que a audiência pública tem o papel de resgatar a história e insistir para que se chegue à Verdade, cuja revelação está sob a responsabilidade do Estado brasileiro. “Estamos no capítulo da Memória. Está difícil chegar à Verdade, ela é o segundo ponto, ainda está com os agentes e com os donos da [grande] mídia. Estamos longe do terceiro ponto: a Justiça”, destacou.
Por Thaís Barreto, jornalista e assessora da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, presidente Adriano Diogo