Confira a análise jurídica do Sindicato e saiba por que a “reforma” destrói os direitos da categoria. PLC 38/2017 será votado na quarta-feira (28) na Comissão de Constituição e Justiça do Senado
A “reforma” trabalhista (PLC 38/2017), defendida pelo presidente ilegítimo Michel Temer (PSDB), será votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na próxima quarta-feira (28), terceira e última comissão na qual a proposta será discutida antes da decisão final pelos 81 senadores no plenário, prevista para a primeira semana de julho.
Nesta terça (21), a base do governo golpista sofreu uma derrota com a rejeição do relatório do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) por 10 votos a nove na Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Na primeira votação, no último dia 6, foram 14 votos a favor e 11 contrários ao relatório na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).
O que é alegado como um “ajuste do marco regulatório do mundo do trabalho no Brasil” pelo relator da proposta, senador Romero Jucá (PMDB-RR), representa, na prática, a demolição de direitos dos jornalistas e de todo o conjunto da classe trabalhadora, avalia a direção do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP).
Por isso, enquanto a tramitação continua no Congresso Nacional, o Sindicato segue mobilizando e orientando quanto aos impactos que a “reforma” trará à categoria caso o PLC 38/2017 seja aprovado. Considerando as especificidades do trabalho no jornalismo, a Secretaria Jurídica do SJSP fez uma análise destacando as 20 principais mudanças e impactos para os jornalistas. Confira.
1. Prevalência do negociado sobre o legislado – a mudança é que se podem reduzir direitos. Hoje, já é permitido que os sindicatos negociem com as empresas pontos previstos em lei, mas só para melhorar as condições de trabalho. Os direitos trabalhistas legais são o mínimo. O projeto permite que as empresas forçem negociações nocivas aos trabalhadores, sem a necessidade de qualquer contrapartida.
2. Fim da homologação no Sindicato – atualmente, quando o trabalhador é demitido (com mais de um ano no emprego), a empresa tem de homologar sua demissão no Sindicato dos trabalhadores. Isso permite que a entidade sindical confira as contas e alerte o trabalhador sobre os direitos que a empresa possa estar sonegando. Além do mais, também permite que o Sindicato tenha conhecimento das demissões que ocorrem na categoria. O projeto prevê que a homologação seja feita diretamente pela empresa, sem a participação do Sindicato.
3. Criação de uma nova modalidade de demissão sem justa causa, na qual o trabalhador recebe apenas metade da multa do FGTS e do aviso-prévio, além de só poder sacar apenas 80% do Fundo de Garantia e perder o direito ao seguro-desemprego – abre uma nova forma de pressão contra o trabalhador, forçando acordos de demissão com redução de direitos.
4. Criação de banco de horas por acordo individual, sem a intermediação do Sindicato – hoje, a lei garante o respeito à jornada de trabalho, com o pagamento de horas extras (se as empresas não cumprem, violam a lei). Mas é possível flexibilizar a jornada, se houver acordo com o Sindicato. Isso permite que os trabalhadores negociem coletivamente a questão com as empresas. O acordo individual acaba com isso: como a empresa é a parte forte das relações de trabalho, ela pode impor sua posição ao assalariado individualmente.
5. Jornada de 12 horas X 36 horas por acordo individual, ou seja, sem a participação do Sindicato – é o mesmo problema do ponto anterior. Na relação de trabalho frente ao assalariado, a empresa tem posição de força e pode impor o que quiser.
6. Autorização para demissões coletivas, sem exigência de negociação prévia com o sindicato de trabalhadores – hoje, há jurisprudência considerando que, em caso de demissões coletivas, as empresas têm de avisar previamente as categorias, por meio dos sindicatos, para que haja uma negociação. Com base nisso, o SJSP tem conseguido forçar negociações que estabeleceram contrapartidas, barraram demissões e até chegaram à reintegração de demitidos. Agora, a lei “libera” demissões em massa.
7. Retirada da natureza salarial de verbas pagas a título de “ajuda de custo”, diárias de viagens, abonos, vale-refeição (ainda que pagos em dinheiro) e prêmios pagos ao empregado – a medida “legaliza” o salário “por fora” (sem incidência de Fundo de Garantia, férias, 13º salário etc.), propiciando que as empresas fixem um salário baixo (como um piso salarial) sobre o qual incidem direitos, e determinem o restante do salário como verbas adicionais, sem direitos associados.
8. Limitação dos valores em caso de condenação por danos morais em no máximo R$ 50 mil – a determinação inclui até acidentes de trabalho, mesmo em casos de responsabilidade direta do empregador. Com isso, um trabalhador pode sofrer um dano que o impeça de ter uma vida produtiva, mas a empresa responsável não poderá ser condenada a arcar com as consequências de seu ato.
9. Em três pontos: dificulta a responsabilização solidária do grupo econômico em caso de não pagamento ao trabalhador, livra o ex-sócio de empresa da dívida trabalhista de seus antigos empregados e deixa os débitos à empresa sucessora, impedindo que o empregador originário seja acionado – hoje, já são muitos os casos em que trabalhadores ganham ações trabalhistas, mas não conseguem ser pagos (pois a antiga empresa alega não ter patrimônio, bem como os seus donos, para honrar os compromissos). Os jornalistas sabem muito bem disso, como nos casos da Gazeta Mercantil, TV Manchete e Diários Associados. A lei introduz ainda mais obstáculos para que se responsabilize judicialmente empresas do grupo, seus donos ou seus compradores, facilitando aos empresários que “esvaziem” empresas em dificuldades e deixem os trabalhadores na mão.
10. Desestimula o ingresso de reclamações trabalhistas, pois limita a concessão de gratuidade da Justiça e impõe o pagamento ao trabalhador de honorários advocatícios e periciais (ainda que ele ganhe vários pontos do processo) – hoje, o trabalhador entra com ação judicial para reclamar de questões legais não respeitadas pelas empresas. No caso de jornalistas, são correntes ações pelo não pagamento de horas extras (situação generalizada na categoria), não pagamento de adicional noturno, não cumprimento de intervalo intrajornada, acúmulo de função e equivalência salarial (decorrente do exercício de função de responsabilidade sem que a empresa formalize o cargo). Segundo o projeto, mesmo que o trabalhador ganhe em diversos pontos, terá de pagar honorários para os pontos que a Justiça não lhe der ganho de causa. A medida visa expressamente bloquear o ingresso de ações trabalhistas.
11. Cria a figura do empregado “hipersuficiente”, aquele que ganha mais de dois tetos da Previdência (hoje, pouco mais de R$ 11 mil). Ele poderá ser obrigado a aceitar (ou “negociar”) individualmente, sem a proteção do Sindicato, direitos como parcelamento de férias, banco de horas, PLR, bem como assinar um “compromisso de arbitragem”, renunciando previamente à proteção da Justiça do Trabalho em caso de descumprimento do contrato – o projeto deixa os assalariados com remuneração acima de R$ 11 mil totalmente desprotegidos diante das empresas, que terão facilitado o caminho para o desrespeito total às relações de trabalho.
12. Dificulta as regras para a obtenção da equiparação salarial entre empregados da mesma empresa – a legislação já é restritiva neste ponto, e os jornalistas sabem bem disso. Com frequência, as empresas jornalísticas ampliam as responsabilidades dos jornalistas, dando-lhes funções de chefia, sem melhorias no salário. O projeto dificulta ainda mais a reclamação relativa a este ponto.
13. Criação de representação de trabalhadores por empresa sem qualquer ligação com os sindicatos – facilita a criação de órgãos de “representação” dos trabalhadores sob pressão direta das empresas. A determinação de que não tenham ligação com os sindicatos visa esvaziar o caráter de representação e negociação coletiva das entidades sindicais, enfraquecendo seu papel. Isso abre o caminho para que as empresas rebaixem ainda mais direitos coletivos.
14. Cria a homologação judicial de acordo entre empresa e trabalhador demitido sobre as verbas rescisórias e sobre qualquer direito trabalhista, sem a participação do Sindicato – com isso, abre-se a possibilidade de a empresa impor ao trabalhador individualmente um acordo que rebaixe ou parcele o pagamento de verbas rescisórias (cuja obrigação legal é o pagamento em dez dias após a demissão), sem que o Sindicato sequer tenha conhecimento do caso. Hoje, qualquer caso desse passa por negociação sindical, com a imposição de multas adicionais, correção e garantias legais ao trabalhador.
15. Regulamentação do teletrabalho apenas para registrar que o trabalhador não tem direito a horas extras, ainda que seja obrigado a ir até a empresa – isso permite que o trabalhador seja obrigado a fazer jornadas totalmente desregulamentadas, sem que possa cobrar a empresa por isso.
16. Criação do trabalho intermitente – modalidade altamente nociva ao assalariado e benéfica ao empregador, pois o empregado fica gratuitamente à disposição da empresa para ser acionado quando esta quiser, mas só recebe pelo tempo que trabalhar. Uma vez convocado, se confirmar a presença e faltar, terá de pagar multa para a empresa.
17. Derruba a prorrogação dos efeitos das Convenções Coletivas e dos Acordos Coletivos vencidos enquanto não forem renovados (ultratividade) – com isso, enquanto o sindicato dos trabalhadores e o das empresas negocia a renovação de uma convenção, suas cláusulas perdem efeito legal. Hoje, isso não ocorre. Assim, se as negociações passam da data base, deixa de existir o piso salarial, por exemplo, que é determinado por Convenção Coletiva, até a renovação do acordo. No caso dos jornais e revistas da capital e do interior e litoral, por exemplo, a última convenção foi assinada somente em dezembro passado, seis meses depois da data base, que foi em junho de 2016.
18. Determina a possibilidade de terceirização de atividade-fim – como se sabe, a terceirização é uma forma de reduzir custos com salários e direitos trabalhistas. O projeto deixa clara a possibilidade de que as empresas terceirizem sua atividade, reforçando as condições para a precarização do trabalho, a redução de salários e de direitos.
19. Troca do índice de atualização de débitos trabalhistas pela TRD (taxa referencial diária, do Banco Central) – os valores devidos aos assalariados pelas empresas deixam de ser corrigidos pela inflação, em medida que prejudica de forma explícita os trabalhadores, reduzindo os valores que têm a receber.
20. Limitações à Justiça do Trabalho na análise do mérito de Acordos Coletivos e na criação de súmulas – hoje, a Justiça do Trabalho decide sobre o mérito de Convenções e Acordos Coletivos, sobretudo em casos de greve, e estabelece súmulas para situações em que não há clareza em lei. Reforçando o que já faz boa parte dos pontos da reforma, este explicita a disposição de tolher a possibilidade de os trabalhadores usarem a Justiça do Trabalho para garantir direitos. O objetivo explícito é deixar as empresas de mãos livres para ampliarem a exploração dos trabalhadores, deixando-os sem defesa para impedir abusos. Ampliam-se assim as desigualdades nas relações de trabalho, nas quais a força já está totalmente do lado das empresas.
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Escrito por: Flaviana Serafim – Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo