O Projeto de Lei 7.376/10, aprovado na Câmara Federal e no Senado (sob número 88/2011) criou a Comissão da Verdade. Ela tem como objetivo esclarecer crimes cometidos durante a ditadura militar e boa parte desta história (ainda não encerrada) foi escrita por jornalistas. Muitos deles perderam suas vidas na defesa da democracia ou foram vítimas da violência que o regime de exceção praticou não somente contra profissionais de imprensa, mas indiscriminadamente contra a sociedade civil.
A vida nas redações naquele período (1964 a 1978) foi assolada pela censura e a falta de liberdade de expressão. O governo, através de censores, determinava as matérias que poderiam ser publicadas. Aqueles que tentavam furar o bloqueio para informar a população sobre a real situação que vivia o país eram perseguidos, presos, torturados e assassinatos.Este foi o caso do chefe do Departamento de Jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog, morto nas dependências do DOI-Codi em 1975.
O episódio, considerado “o início do fim” da ditadura, escancarou para sociedade o que ocorria nos porões da repressão. A partir daquele momento, o Sindicato (que batizou o seu auditório em homenagem ao jornalista assassinado) passou a ser ponto de reunião dos que resistiam à opressão. Outra vítima da ditadura que era jornalista foi Luiz Eduardo Merlino, assassinado em julho de 1971. Durante 24 horas ele foi barbaramente torturado e abandonado em uma solitária nas dependências do DOI-Codi, então chefiado pelo major Brilhante Ustra.
Joaquim Câmara Ferreira, o comandante Toledo, é outro jornalista que se destacou na luta contra o regime militar. Ele participou da resistência ao golpe de 1964 e foi assassinado nos porões da ditadura em 1970. Como militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Ferreira já havia sido preso e torturado pela polícia política do Estado Novo de Getúlio Vargas em 1940. Foi redator do jornal Vanguarda Estudantil, tradutor da France Press, editor e diretor das publicações Hoje e Notícias de Hoje, ambas ligadas ao Partidão. Era associado do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, sob o número 432.Rompeu com o PCB, dando origem ao chamado Agrupamento Comunista de São Paulo, embrião da ALN – Ação Libertadora Nacional, cujos dois principais líderes foram Carlos Marighela e o próprio Toledo.Preso em 23 de outubro de 1970 pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, faleceu em consequência das bárbaras torturas.
O Sindicato como trincheira
A jornalista Rose Nogueira, que na época da repressão trabalhava na TV Cultura (de 1972 a 1975), e que hoje, é secretária de Comunicação e Cultura do Sindicato e presidente do Grupo Tortura Nunca Mais/SP, relembra como era difícil trabalhar nas redações. “As ameaças chegavam através de bilhetes. Todo dia vinham telex avisando a gente o que podia e o que não podia ser divulgado”, conta. “Esses avisos eram pregados num mural, consultado pelos jornalistas antes de redigirem as matérias que iriam ao ar”, relembra.
Como contraponto à censura que amordaçava a grande imprensa surgiram jornais da chamada “imprensa alternativa”. Publicações como Versus, Coojornal, Repórter, Opinião, Movimento, Em Tempo, Pasquim, entre outros, reuniu grupos de jornalistas empenhados em denunciar a repressão brasileira.
O Sindicato teve papel importante na luta pela democratização do país. Para o ex-presidente da entidade, Audálio Dantas, a ação da categoria tornou-se símbolo da resistência ao regime militar. “Naqueles dias, o Sindicato era a principal trincheira, referência para a sociedade civil na luta contra a repressão. O processo que levaria à denúncia do assassinato de Vlado, contudo, começara meses antes, com a vitória da nossa chapa nas eleições para a diretoria do Sindicato em abril. Os sindicatos eram mantidos sob estrito controle pela ditadura, mas o dos jornalistas começou a falar, a levantar questões proibidas, como a censura, a política salarial e outras. Em julho, dois meses depois da posse, a diretoria foi convocada ao II Exército para explicar nota distribuída à imprensa em que contestava acusações de que as redações estavam “dominadas” pelos comunistas”, relata Audálio. Hoje, o Sindicato, junto com outras entidades da sociedade civil, integra o Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça que acompanha o andamento e implantação da Comissão da Verdade.