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Jornalistas brasileiros são etiquetados pelo Twitter como mídia estatal russa; Sindicato vê tentativa de constrangimento e censura aos profissionais

Jornalistas brasileiros são etiquetados pelo Twitter como mídia estatal russa; Sindicato vê tentativa de constrangimento e censura aos profissionais

Jornalistas brasileiros, que prestam ou prestaram serviço a agência de notícias russa Sputinik, foram tagueados pelo Twitter como afiliados à mídia estatal russa. A medida, que pretende contextualizar quais contas são de representantes oficiais de governos, tem afetado profissionais de imprensa em todo o mundo.

O relato dos jornalistas brasileiros é de que receberam um aviso do Twitter por e-mail informando sobre a rotulagem, mas que a plataforma não possibilita a retirada, uma vez que os caminhos indicados não solucionam o problema.

Para o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP), é inaceitável que o Twitter ou qualquer plataforma discrimine ou tente censurar jornalistas. “Os profissionais que trabalham no Brasil ou em outros países são apenas empregados da empresa, sendo submetidos a relações de trabalho como as que ocorrem em qualquer outra redação. E como sabemos bem, as posições editoriais de uma empresa nada têm a ver com aquilo que seus profissionais acreditam ou compartilham. E neste caso, os jornalistas realizavam sua cobertura especificamente para abordar temas relacionados ao Brasil ou já nem atuavam mais pelo veículo, o que deixa ainda mais claro que não possuem relação com a guerra na Ucrânia”, diz o presidente do SJSP, Thiago Tanji.

“Chega a ser esdrúxulo o algoritmo da rede social classificar como ‘conteúdo de mídia russa’ qualquer tipo de mensagem escrita na conta pessoal do jornalista. Mais do que uma falha no algoritmo, isso não deixa de ser uma tentativa de constrangimento ao profissional”, completa Tanji.

Marco Antônio Pereira, que não trabalha mais para a agência desde maio de 2021, se questionou sobre a rotulagem: “Como órgãos públicos, talvez a pecha de ser ‘etiquetado’ pelo Twitter não seja tão pesada. Mas com indivíduos já é mais complicado, ainda mais no meu caso que nem relação mais tinha com a Sputnik. Fico perguntando de onde eles tiraram isso. De meus tuítes antigos?” O jornalista permaneceu com a tag por duas semanas.

Já um jornalista que prefere não ser identificado e que cobre temas como Brasil e racismo para a agência, segue rotulado e considera a medida prejudicial. “Para mim, a medida é injusta, pois, além de ser uma pessoa física, não tomo decisões editoriais na empresa, assim como, obviamente, não tenho nenhuma ligação com o governo russo. Fora isso escrevo para e tenho ligações com outras mídias.”

O jornalista, que está no Brasil e sequer fala russo, ficou temeroso. “Eu fiquei com medo de sofrer ataques por conta da tag e fechei o meu perfil”, relata. Seu perfil no Twitter é pessoal, mas faz uso profissional da plataforma, como muitos profissionais de imprensa. Ele tentou contato com o Twitter para retirar a tag, mas segue sem conseguir solucionar. “Minhas tentativas foram encaminhadas para formulários que não atendem ao problema que quero resolver”, diz.

Outro jornalista brasileiro tagueado é Marcelo Moreira França. Ele não trabalha na agência desde janeiro de 2021 e, assim como os outros, não entendeu os motivos que o levaram a ser tagueado e tão pouco encontrou solução pelos caminhos dados pelo Twitter. “Conversei com ex-colegas da Sputnik e alguns também tinham sido tagueados. Algumas ações foram tentadas e outras combinadas, tudo rumo à um esclarecimento por parte do Twitter. Eu tentei ajuda dentro do aplicativo, mas é um labirinto. Não consegui enviar mensagem”, afirma o profissional.

Prejuízo pessoal e profissional

A falta de transparência das políticas adotadas pelas plataformas não é uma novidade.

Para o cientista político e pesquisador da sociedade informacional, Sérgio Amadeu, a adoção de tags por parte do Twitter é extremamente preocupante. Apesar de se colocarem em posição de neutralidade, Amadeu destaca que, no caso do Twitter, a rede social segue os interesses do Departamento de Estado norte-americano. “Além disso, as plataformas não possuem critérios transparentes e nenhum controle democrático sobre a gestão algorítmica dos processos, redução da visualização e bloqueios de conteúdos que praticam”, explica.

Para Amadeu, o tagueamento dos jornalistas brasileiros é um ataque à liberdade de imprensa ao passo que a medida tem como objetivo desqualificar as publicações dos profissionais. “[Para solucionar a questão] é preciso recorrer ao Judiciário brasileiro. Esse tagueamento visa estigmatizar os jornalistas. Obviamente o Twitter vai alegar que atua conforme seus arbitrários termos de uso.”

Por fazer pouco uso da plataforma, Marco Antônio não se sentiu prejudicado, mas admite que a medida pode afetar os profissionais. “Não creio que tenha me prejudicado não, mas o profissional que trabalha para a Sputnik, como meus ex-colegas, e que usam muito a rede social pode haver algum prejuízo de imagem”, reconhece.

Para Marcelo, há um erro de informação por parte da plataforma desencadeando uma sucessão de equívocos. “Não sou ‘Russia media affiliated’. Eu fui. Por que então continuar me rotulando assim?”, questiona. Para o jornalista, a forma com a qual a tag foi atribuída é errada, bem como a dificuldade imposta aos profissionais para corrigi-la. “Me sinto prejudicado pessoalmente. Porque há um erro ali. Uma situação que não existe. Não sou mais aquilo que eles dizem que sou. Não é correto. E a forma feita, idem. E me incomoda não poder corrigir isso.” Para deixar de ser marcado pela tag, Marcelo incluiu na biografia de seu perfil que não pertence mais à agência de notícias russa Sputinik.

Indicar que não faz mais parte da mídia também foi o caminho adotado pelo jornalista Marco Antônio. Em 5 de março, o jornalista tuitou que não fazia mais parte do veículo e, apenas nesta quarta-feira (16), o profissional constatou que a tag havia sido retirada de seu perfil.

Para o profissional que prefere não se identificar, no entanto, o caminho deve ser mais tortuoso. O jornalista ainda presta serviços à agência russa e tem procurado diversas organizações que defendem profissionais de imprensa na busca de solução. Enquanto isso o perfil, fechado por medo de retaliação, segue tagueado mesmo estando a quilômetros de distância da Rússia e de seus interesses geopolíticos.

O presidente do SJSP, Thiago Tanji, alerta para o caso como um precedente perigoso: “Estamos vivendo uma situação extremamente complexa e grave do ponto de vista geopolítico, mas tais medidas adotadas para ‘taguear’ e ‘discriminar’ os profissionais poderiam ser perfeitamente realizadas pelas redes sociais para penalizar àqueles que compartilham qualquer tipo de informação contrária aos interesses das empresas sediadas nos Estados Unidos (ou em qualquer outro país). Isso não deixa de ser uma violência contra os cidadãos de diferentes locais do mundo que nada têm a ver com os interesses econômicos ou políticos que essas plataformas defendem.”

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