O 4º Dossiê de Censura e Governismo na EBC, lançado na última quarta-feira (31/08), mostra que, de agosto de 2021 a julho de 2022, foram contabilizadas 292 denúncias de censura e governismo nos veículos públicos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC): Rádio Nacional, Rádio MEC, TV Brasil, Agência Brasil, Radioagência Nacional e as respectivas redes sociais. O levantamento é elaborado pela Comissão de Empregados da EBC e os Sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas do Distrito Federal, Rio de Janeiro e São Paulo.
Foram contabilizados 228 casos de governismo e 64 de censura no formulário de denúncia. Os responsáveis pelo levantamento lembram que “nem todos os casos são denunciados”, mas “o documento apresenta uma amostragem significativa de casos em diversas áreas, na programação jornalística e de entretenimento”.
Segundo os trabalhadores da EBC, continuam alvo preferido de censura temas como direitos humanos, questões indígenas, conflitos no campo, ditadura e qualquer assunto que exija posicionamento do governo. É recorrente a tática de derrubar matérias já prontas, quando o órgão oficial não envia respostas à reportagem.
O levantamento apresenta também a categoria “pautas irrelevantes”, que somaram mais de 200 denúncias. Segundo a Comissão de Empregados da EBC esse tipo de conteúdo configura “expediente que se tornou comum na EBC: ocupar as equipes com a produção de reportagens e conteúdos sem importância para a sociedade nem interesse público, de forma que os trabalhadores ficam sem tempo para tocar conteúdos de maior qualidade”.
Como exemplo da prática de “pautas irrelevantes”, foram registradas pautas como dia do chocolate, o dia da batata frita e o dia do cuscuz, o episódio de uma vaca flagrada descendo por um tobogã e a divulgação da areia sustentável da companhia Vale.
O uso dos veículos para promoção pessoal do presidente Jair Bolsonaro se aprofundou, principalmente na TV Brasil, que passou a ter a grade unificada com o canal governamental NBR em 2019. No período analisado, foram ao todo 274 eventos com o presidente transmitidos ao vivo, que ocuparam ilegalmente a grade da TV pública por 192h58min18s. No período anterior, foram 208 eventos, que somaram 157h42min29s.
Trabalhadores
Os casos de perseguição e adoecimento mental se multiplicam na empresa. De acordo a Comissão de Empregados da EBC, reuniões de pautas e conversas sobre as coberturas não são mais realizadas. “Impera a linha autoritária de comando e o desgaste das equipes, reduzidas por planos de demissão voluntária e falta de concurso”.
“O sufocamento dos trabalhadores ocorre também pela suspensão do Acordo Coletivo, que agora está na justiça, por falta de negociação por parte da empresa. A categoria segue há cinco anos sem recomposição salarial pelo índice de inflação, incluindo três anos sem recomposição nenhuma”, diz o documento.
Algumas formas de resistência estão em curso. Além do dossiê e da Ouvidoria Cidadã da EBC, foram feitas denúncias de uso indevido dos veículos públicos ao Tribunal Superior Eleitoral e à CPI da Pandemia. A Rádio MEC e a Nacional também foram declaradas Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado do Rio de Janeiro. Por iniciativas como essas, o conjunto dos trabalhadores da EBC será homenageado este ano pela 44ª edição do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos (PVH).
Os trabalhadores também chamam atenção para a necessidade de candidaturas ao Planalto e ao Congresso Nacional defenderem a EBC como instrumento da democracia brasileira. “Precisamos que as candidaturas em todos os níveis se comprometam com a comunicação pública e que os presidenciáveis incluam o tema em seus programas de governo e declarações públicas. A comunicação pública é um indicador da democracia e consta de marcos internacionais da Unesco e da OCDE, além de ser um importante instrumento de democratização da comunicação no país”, diz o dossiê.
“Não menos importante é a instalação de mecanismo similar à Comissão da Verdade para apurar e punir abusos e ilegalidades cometidos na empresa de comunicação pública nos últimos anos”, completa o texto.