A TV Brasil, emissora pública federal, foi usada mais uma vez, no último domingo, 12/4, como palanque político-religioso pelo presidente Jair Bolsonaro, por meio de uma “celebração de Páscoa” em videoconferência com líderes evangélicos, transmitida ao vivo pela TV aberta e pelos canais da emissora pública nas redes sociais.
A pretensa “celebração religiosa” na verdade foi uma ato de apoio político ao presidente da República, que vem descumprindo protocolos de saúde pública usados em todo o mundo em meio a pandemia do Coronavírus que já matou mais de mil pessoas em todo Brasil. Bolsonaro gastou cerca de 13 minutos para se defender das críticas que vem recebendo e afirmou que “parece que está começando a ir embora essa questão do vírus, mas está chegando e batendo forte a questão do desemprego”. Dados do próprio Ministério da Saúde mostram que o número de mortes ainda deve aumentar nos próximos dias e que o país ainda não atingiu seu pior momento na crise de saúde pública.
Foram mais de duas horas de programação política-religiosa com a presença de 23 representantes de igrejas cristãs, sendo 21 pessoas de igrejas evangélicas e duas da igreja católica. Em meio a orações e canções gospel os participantes transmitiram mensagens políticas para os telespectadores, todas em apoio às medidas tomadas pelo presidente Bolsonaro com relação a não necessidade de isolamento social em meio a pandemia do coronavírus.
Por exemplo, o pastor R.R. Soares, da Igreja Internacional da Graça de Deus, afirmou que a pandemia do coronavírus é “uma revolta do Diabo porque o Brasil está se tornando do Senhor Jesus” e que Bolsonaro “no governo de agora ou se Deus der outro mandato” fará com que o Brasil tenha a maioria do povo sendo da religião evangélica. E termina sua participação de forma ainda mais proselitista: “O povo colocou no senhor a esperança, sentiu de Deus, a coisa estava brava, houve uma mudança tremenda, e se o senhor não fizer mais nada, aquilo que o senhor já fez de mudança já foi muita coisa.”
A transmissão deste proselitismo político-religioso marca o mais grave momento de instrumentalização da TV Brasil desde que a direção da EBC – Empresa Brasil de Comunicação – promoveu a fusão da emissora estatal NBR, com sua emissora pública, a TV Brasil, em abril de 2019. Desde então, a emissora vem sofrendo com diversos casos de censura apontados pelos jornalistas da casa, retirou do ar programas culturais e de cunho LGBT e oferece em sua programação apenas a versão do Governo Federal dos fatos, sem espaço para o contraditório ou críticas às ações Poder Executivo.
Ao transmitir o ato político-religioso deste domingo de Páscoa, a TV Brasil desobedeceu a própria legislação que criou a EBC, que veda qualquer forma de proselitismo na programação das emissoras públicas de radiodifusão (art 3º – § 1o).
A exibição também contraria ao Artigo 19 da Constituição Federal, que proíbe qualquer favorecimento a uma religião, em detrimento das outras, e consagra o princípio do Estado laico. A própria lei da EBC é explicita em proibir qualquer discriminação religiosa e concede à Direção da empresa para ter autonomia de sua programação em relação ao Governo Federal.
O que foi feito pelo presidente Jair Bolsonaro neste domingo de Páscoa foi muito além de proselitismo religioso. Foi o aparelhamento político explícito da TV Brasil para manifestações de apoio de lideranças religiosas num momento onde o presidente enfrenta sua maior crise desde que tomou posse em janeiro de 2019. A instrumentalização da TV Brasil desta forma fere todos os princípios de impessoalidade e de caráter público da EBC e de seus canais de televisão e de rádio.
Medidas judiciais para penalizar os responsáveis pela transmissão precisam ser tomadas urgentemente, para manter o mínimo que resta de público da emissora que deveria ser de todos os brasileiros.
Comissão de Empregados da EBC
Sindicatos dos Jornalistas do DF, RJ e SP
Sindicatos dos Radialistas do DF, RJ e SP
Federação Nacional dos Jornalistas