Categoria é formada por 64% de mulheres que conquistaram espaço graças às lutas históricas
As mulheres são 64% dos jornalistas que atuam na profissão, mas ainda são minoria nos cargos de chefia. Foi o que revelou pesquisa realizada pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) junto a 2.371 profissionais de todo o Brasil em 2013. Elas são a maioria nas redações, mas nem sempre foi assim. Em 15 de abril de 1937, quando o Sindicato foi fundado, só havia uma única presença feminina na diretoria: Margarida Izar, que compunha o então Conselho Fiscal. A baixa representatividade feminina na entidade de classe era correspondente ao pouco que existia de trabalho feminino no jornalismo naquele período. Era, então, uma função predominantemente masculina.
Graças ao empenho de muitas militantes, este quadro foi sendo alterado com o passar dos anos. Já ao final da década de 1950, a presença feminina nas redações já apresentava um equilíbrio maior em relação aos homens, a ponto dos Sindicatos de Jornalistas de vários estados debaterem, durante o V Congresso Nacional dos Jornalistas, realizado em Curitiba (PR) em setembro de 1953, a criação de Departamentos Femininos nos Sindicatos.
Já em 1956, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no estado de São Paulo (SJSP) criou o seu Departamento Feminino, o pioneiro no Brasil. Seu objetivo, conforme documentos da época, era “centralizar os problemas profissionais das mulheres que trabalham na Imprensa, rádio, televisão, favorecendo-lhes a luta pela concessão de seus urgentes e legítimos direitos”.
Na prática, no entanto, o Feminino ficou subordinado ao Departamento Cultural e Recreativo do Sindicato e a diretoria de 1959 decidiu encerrar as suas atividades. Desde Margarida Izar, da gestão de 1937, o Sindicato só veio a ter outra mulher na direção apenas 20 anos depois, em 1957, com Gracita de Miranda (que era suplente da diretoria).
Em 2011, no mês das Mulheres, o Sindicato prestou uma homenagem a várias profissionais que possuíam mais de 50 anos de sindicalização. Naquela oportunidade foram homenageadas no auditório Vladimir Herzog as jornalistas Neusa Sant´Ana Pinheiro Coelho, Clara Clouzet, Regina Helena de Paiva Ramos, Lenita Miranda de Figueiredo, Neyde Soares e Alice do Carmo Calderaro Martins. Elas receberam flores e placa comemorativa.
Mulheres e o voto
Também para participar da política institucional, as mulheres também tiveram que lutar. As mulheres conquistavam, depois de muitos anos de reivindicações e discussões, o direito de votar e serem eleitas para cargos no Executivo e Legislativo. Isso ocorreu no dia 24 de fevereiro de 1932, durante o governo de Getúlio Vargas. Através de um Código Eleitoral Provisório, o voto feminino no Brasil foi assegurado, conquistado após intensa campanha nacional, fruto de uma longa luta, iniciada antes mesmo da Proclamação da República. No entanto, ele foi aprovado parcialmente por permitir somente às mulheres casadas, com autorização dos maridos, e às viúvas e solteiras que tivessem renda própria, o direito ao voto. Em 1934, as restrições foram eliminadas, embora a obrigatoriedade fosse um dever masculino. Em 1946, a obrigatoriedade do voto foi estendida às mulheres.
A primeira mulher a ter o direito de votar no Brasil foi Celina Guimarães Viana, ainda antes do Código Eleitoral de 1932. Aos 29 anos, Celina pediu em um cartório da cidade de Mossoró, no Rio Grande do Norte, para ingressar na lista dos eleitores daquela cidade. Ela votou nas eleições de 5 de abril de 1928, aproveitando a Lei n◦ 660, de outubro de 1927, que estabelecida as regras para o eleitorado solicitar alistamento e participação. Em todo o país, o estado potiguar foi o primeiro a regulamentar seu sistema eleitoral, acrescentando um artigo que definia o sufrágio sem ‘distinção de sexo’. O caso ficou famoso mundialmente, mas a Comissão de Poderes do Senado, não aceitou o voto. No entanto, a iniciativa da professora marcou a inserção da mulher na política eleitoral.
Cinco anos antes de aprovado o Código Eleitoral Brasileiro, que estendia as mulheres o direito ao voto, no sertão do Rio Grande do Norte, já ocorrera à eleição de uma prefeita. A fazendeira Alzira Soriano de Souza, em 1928, se elegeu na pequena cidade de Lajes, cidade pioneira no direito ao voto feminino. Mas ela não exerceu o mandato, pois a Comissão de Poderes do Senado impediu que Alzira tomasse posse e anulou os votos de todas as mulheres da cidade, porque a participação de mulheres na eleição fora autorizada excepcionalmente graças a uma intervenção do candidato a presidente da província, Juvenal Lamartine.
Nas eleições de 1933, a médica, escritora e pedagoga Carlota Pereira de Queirós foi eleita, tornando-se a primeira mulher deputada federal brasileira. Ela participou dos trabalhos na Assembléia Nacional Constituinte, entre 1934 e 1935. Como resultado dessa luta, em 2010, Dilma Rousseff se elegeu como a primeira presidenta do Brasil.
Fortalecimento da democracia
Este ano, a Central Única dos Trabalhadores de São Paulo (CUT/SP) teve como mote para os debates para o Mês da Mulher , a “Defesa e fortalecimento da democracia, com igualdade, autonomia e liberdade para as mulheres”. Para a secretária da Mulher Trabalhadora da CUT/SP, Sonia Auxiliadora Vasconcelos Silva, o tema é pertinente pois, segundo ela, há tentativas de desestabilizar um governo eleito e apoiado pela maioria do povo brasileiro. “Não é possível aceitar que os perdedores da disputa eleitoral queiram desestabilizar o país, golpeando a vontade popular, expressa em milhares de votos, e jogando fora o conjunto de avanços e conquistas que tivemos no Brasil. Querem, ainda, rifar a Petrobras, destruindo um patrimônio que é de toda a nação, mas não querem uma reforma política que combata a corrupção”, argumenta.
Sonia acredita que as ações do governo federal às mulheres cresceram nos últimos governos, mas é preciso avançar ainda mais. “No mercado de trabalho, as mulheres ainda recebem salários até 30% menores que o dos homens para a mesma função e ainda há lutas importantes como a licença maternidade de 180 dias, por mais creches, pelo compartilhamento das tarefas domésticas que, mesmo sendo responsabilidade de toda a família, recaem ainda sobre as mulheres”, diz.
Veja o que elas pensam
Unidade ouviu cinco profissionais para saber como elas analisam a condição das mulheres
Mônica Tarantino
Repórter da revista Istoé e Brasileiros
Conversei com sete amigas jornalistas de veículos impressos para comparar nossas percepções. Concordamos que as condições estão ruins para todos. Mas, tirando as revistas femininas, há uma desproporção notável no número de homens e mulheres à frente das grandes redações no País. E algumas colegas disseram que há homens na mesma posição ganhando mais. É um bom tema para uma pesquisa na categoria.
Vivenciei sim o machismo! Na entrevista para uma vaga de repórter em uma revista de Agribusiness, o editor me disse que pensava duas vezes antes de contratar mulheres porque elas engravidam…
Mulheres hetero e lésbicas, bissexuais, gays, todos e todas ouvem piadas preconceituosas, gracejos idiotas e podem ser alvo de assédio moral às claras ou de uma forma mais velada. Se você não for um homem heterossexual, está vulnerável.
Devemos pegar pesado na discussão sobre a igualdade de gênero. Eu já presenciei diversas situações evidentes de discriminação que passaram impunes.
O Sindicato deveria estimular o debate sobre diversos temas.
Pouca gente conhece a história da data (do porque do Dia da Mulher). Sabe o que reivindicam as operárias que morreram incendiadas em 8 de março de 1857 em uma fábrica em Nova Iorque (EUA)? Redução da carga diária de trabalho, equiparação de salários com os homens e tratamento digno dentro do ambiente de trabalho.
Marilu Cabañas
Rede Brasil Atual
Acredito que haja discriminação. Vejo pela minha própria trajetória onde encontrei apenas duas mulheres em cargos de direção do jornalismo. Eles sempre foram ocupados por homens. Na chefia de reportagem encontrei algumas mulheres, mas a predominância masculina.
Na minha opinião, há homens e mulheres que reproduzem a cultura machista. Acho que depende da formação de cada pessoa, ter sensibilidade ou não para temas abordados numa determinada reportagem que necessita de um olhar mais humano e igualitário, sem preconceito ou sensacionalismo.
Quando estava na Rádio Cultura pedi uma semana de licença para cuidar da minha mãe que iria se operar. Não deram. Disseram que iriam descontar das minhas férias e eu não concordei e disse para que eles descontassem do meu salário e descontaram.
Uma colega foi assediada no ambiente de trabalho e prefiro não divulgar a emissora para não comprometê-la. Foi um período muito triste, chocante, onde a jovem profissional se sentiu muito acuada. É impressionante como profissionais do nosso meio ainda são machistas a esse ponto.
Na minha experiência profissional presenciei assédio moral contra homens e mulheres.
Acredito que a presença da mulher nas lutas política e sindical deva ser respeitada e em várias outras frentes.
O papel do Sindicato para nós jornalistas, homens e mulheres, é muito importante. Cada vez mais as empresas optam por contratações de pessoas jurídicas, “pejotas”, ou seja, sem carteira assinada. O jornalista fica sem 13° salário, adicional de férias, reajustes salariais, horas extras e todos os demais direitos e benefícios.
Ana Kalyne
TV Assembleia de SP
Não vejo uma discriminação aberta quanto a essa realidade, mas garanto que as jornalistas em cargo de chefia sempre têm que mostrar mais a competência e serem mais duras para garantir o respeito de homens chefiados que ainda são machistas.
Sempre existe uma certa diferença de olhar dependendo do tema. Mulheres são mais emocionais quando abordam questões como criança, idosos, pessoas com deficiência e em análise de comportamento. O fato é o mesmo. Fazem a matéria com a mesma competência, sem adjetivar, mas sempre colocando um “pitaco” de emoção maior.
Para mim não foi difícil conciliar a maternidade com a profissão.
Tive a oportunidade de ser repórter na TV Gazeta no departamento de Esportes em uma época que eram poucas profissionais na área. Não vivenciei o machismo dentro da emissora, mas fora dela. Principalmente, quando fazia matérias em treinos e jogos de futebol.
Ainda somos encaradas como sexo frágil apesar de todas as conquistas e existem ainda aqueles que acreditam que ficaremos quietas perante esse tipo de assédio. Mulher tem voz e vez e tem que usar isso para se defender dessas situações. Com certeza, com o tempo vamos mostrando a nossa força e garantindo mais respeito.
Não defendo políticas de cotas, mas sim uma maior participação da mulher em todos os setores.
Quando entrei no jornalismo, as mulheres quando admitidas tinham que passar por teste de gravidez. Era um absurdo. Muitas ainda enfrentam batalhas quando decidem ser mães e é um direito nosso. Devemos sempre lutar por igualdade na nossa profissão. Afinal, a competência não está em ser homem ou mulher. Temos que garantir os direitos já adquiridos e nos empenhar em sermos respeitadas como profissionais e mulheres em todas as nossas escolhas.
É essencial sermos representadas. Exatamente para termos nossos direitos garantidos. O nosso Sindicato representa uma categoria profissional que ao longo do tempo tem sido questionada em vários aspectos. Mas, é o sindicato que tem que garantir a nossa liberdade de imprensa, a igualdade salarial, as lutas por melhores remunerações. Eu ainda acredito que a união faz a força e que os sindicatos têm papel primordial em nosso dia a dia profissional.
Rosário Mendez
Assessoria de imprensa do PT Alesp
As mulheres têm cada vez mais ocupado funções importantes na sociedade, como consequência de seu empenho e dedicação. Pesquisas mostram que as mulheres têm buscado constante qualificação e integram o maior quadro de estudantes nos cursos e universidades. Mas, infelizmente, isso ainda não se reflete no reconhecimento financeiro e as mulheres ocupam a mesma função e ou têm sob sua responsabilidade mais atribuições que dos homens e no entanto, recebem menor salário. Eis uma distorção que as mulheres devem tratar e o Sindicato dos Jornalistas pautar como prioridade a ser discutida e enfrentada.
Não acho que o desempenho dos jornalistas esteja vinculado a uma questão de gênero. O compromisso com a apuração das pautas, a realização de entrevistas, reportagens, coberturas, enfim, o desenvolvimento do leque de ações e atividades inerentes à profissão resultam do preparo e compromisso profissional de cada um.
Conciliar a maternidade e o profissionalismo é um grande desafio das mulheres. É comum as mulheres relatarem que vivem conflitos emocionais e que por vezes se sentem em falta e fragilizadas suas relações pessoais e com os filhos. Este é outro tema de grande relevância para ser discutido pelos sindicatos e outros fóruns da sociedade, na construção de maior participação, compartilhamento e envolvimento dos parceiros (as) nas responsabilidades familiares e domésticas.
Já enfrentei o machismo. Há alguns colegas que nos subestimam por ser mulher, quando sugerem que este ou aquele trabalho é mais “adequado” para um homem realizar. Em outras situações minimizam a nossa competência e soltam um; ” você conseguiu falar com aquela fonte eu ou a entrevista por que é mulher.” São comentários pejorativos, machistas que tentam reduzir a competência profissional das mulheres.
As cotas devem vir acompanhadas pelo compromisso político e constituição de meios e estruturas, para que possam de fato ter condições de atuarem e desenvolver o trabalho e dar um outro foco e olhar para atender as demandas da categoria, setor e gênero.
A licença-maternidade, aborto, igualdade de direitos são de suma importância para a sociedade brasileira. Mas a democratização da comunicação deve ser o foco central da categoria e de toda a sociedade brasileira junto com a reforma política.
O Sindicato é um espaço muito importante para as discussões dos problemas da categoria, instrumento de avanços e conquistas do setor e acredito que deve também agir e dialogar em consonância com as demandas da sociedade, não podemos perder de vista o compromisso social da profissão, no avanço da sociedade
Nós temos uma mulher na presidência do nosso país e muitos dos ataques que ela tem sofrido dos meios de comunicação e de alguns setores políticos partidário de maneira pejorativa e agressiva. Sei da força de mulher e nós temos que nos unir e não nos intimidar com os desafios.
Maria Paula Bexiga
Rede Record
Acho que o Jornalismo é um dos poucos setores produtivos onde a mulher tem papel de destaque. No total da categoria, elas representam 64%. E isso é facilmente percebido numa rápida análise dos programas jornalísticos da TV brasileira. A maioria dos repórteres é formada por mulheres. E também estamos ocupando grandes espaços nas redações e por trás das câmeras. Só como exemplo: hoje, coordeno a pauta do Jornal da Record e miinha equipe é composta por 6 mulheres.
Só vejo diferença de cobertura na questão da sensibilidade. Costumamos mandar mulheres para cobrir reportagens que envolvam crianças, mulheres agredidas, pessoas em situação de risco. As mulheres costumam ter mais tato para lidar com a dor dos outros.
Apesar das mulheres serem maioria, os homens são os primeiros a ganhar promoção e chegar a um cargo de chefia.
Acho que, ainda que de forma sutil, o machismo ainda predomina no mercado de trabalho e no caso específico da mulher, o assedio moral costuma estar relacionado à gravidez ou maternidade. Os superiores parecem culpar a funcionária por ser mãe, ter que faltar para levar o filho ao médico, entre outras coisas.
A mulher já mostrou que pode ser bem sucedida em qualquer área, inclusive na política. Já mostramos que a tal “fragilidade do sexo feminino” não é sinônimo de incompetência ou falta de habilidade para o que quer que seja. Temos, sim, que estar cada vez mais integradas na vida sindical, na política, nas discussões quanto ao futuro do país.
Descriminalização do aborto como um direito de cidadania e questão de saúde pública; Ampliação da licença-maternidade de 6 meses, obrigatória a todas as trabalhadoras; salários iguais para homens e mulheres que desempenham a mesma função.
Acho que o Sindicato está sempre aberto para mostrar para as profissionais o papel que ela representa na imprensa nacional, na luta pela igualdade de direitos e ajudar a consolidar as conquistas femininas no jornalismo.
Legenda: Homenagem às mais antigas sindicalizadas
Foto: André Freire