Diante dos acontecimentos dos últimos dias, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) divulga este texto como uma prestação de contas a toda a categoria, transparente e abrangente, e submete-o à apreciação dos jornalistas, para ser debatido democraticamente nesta quinta-feira, às 20h, em assembleia no auditório do Sindicato, que poderá debater novas medidas de segurança aos profissionais.
Frente à hostilidade contra o trabalho de jornalistas – com a ocorrência de ameaças e agressões contra colegas –, combatida pelo Sindicato de forma incessante, a entidade coloca todos os seus meios, materiais e jurídicos, que são da categoria, à disposição de qualquer jornalista agredido. Segue o relato de atuação do SJSP:
1. Desde a noite de quinta-feira (4), quando houve o anúncio da ordem de prisão do ex-presidente Lula, até a noite de sábado (7), diretores e diretoras do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) estiveram presentes ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, para manifestar sua posição em defesa da democracia no país e para batalhar pelo respeito à integridade física e ao exercício profissional dos jornalistas ali presentes.
O Sindicato dos Jornalistas tomou a iniciativa de montar um plantão contra a violência ao jornalista, que começou a funcionar na manhã de sexta-feira (6), com no mínimo um diretor presente na sede do Sindicato, em São Paulo, para dar apoio e resposta a jornalistas ameaçados. Divulgamos o plantão o máximo possível em nossos meios de comunicação com os jornalistas. Em São Bernardo do Campo, onde se davam os acontecimentos, o texto com as informações do plantão foi distribuído para cerca de 150 jornalistas. O plantão funcionou ininterruptamente até cerca de 20h do sábado (7), quando a cobertura foi encerrada, recebendo durante esse período o contato de três jornalistas, e o SJSP agiu prontamente para fazer frente às denúncias recebidas.
2. Diretores do SJSP, a trabalho ou no exercício do mandato sindical, presentes no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, atuaram diretamente para tentar garantir a liberdade de atuação dos jornalistas. Na sexta-feira, no final da manhã, o presidente da CUT, Vagner Freitas, expressando também a posição da nossa entidade e do Sindicato dos Metalúrgicos, fez um pronunciamento no carro de som, a todos os presentes, defendendo o respeito integral ao conjunto dos profissionais de imprensa que atuavam no local. Por volta das 15h, o presidente do Sindicato dos Jornalistas, Paulo Zocchi, teve a palavra diante da multidão reunida, e novamente voltou ao tema, explicando que o direito de protestar contra veículos de comunicação é livre, mas que o trabalho dos jornalistas e sua integridade física tinham de ser totalmente respeitados e preservados por todos. Novamente no sábado, o presidente da CUT voltou a criticar a hostilidade aos jornalistas, defendendo o máximo respeito ao trabalho dos profissionais na cobertura. Em todos os casos, as falas foram aplaudidas pela multidão presente.
3. O presidente do SJSP repudiou ameaças ou agressões em declarações diretamente para órgãos de imprensa, quando procurado, como para a rádio CBN e a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). O Sindicato divulgou desde o início das ameaças sua posição de repúdio a qualquer agressão a jornalistas, e uma nota mais extensa foi divulgada no sábado.
4. No próprio terreno da cobertura, a diretoria do SJSP atuou diretamente em todas as situações que estiveram ao seu alcance:
– no final da manhã de sábado, o repórter P., da rádio CBN, foi hostilizado e agredido dentro do Sindicato dos Metalúrgicos quando, corretamente, postava de maneira visível seu crachá de trabalho. Foi protegido pelos seguranças da entidade, mas teve de sair do recinto. Ao tomar conhecimento do caso, um diretor do SJSP foi atrás do repórter, prestou sua solidariedade e acompanhou-o de volta à entidade, ficando a seu lado até que consideraram que estava novamente em situação de segurança. Também foi dada uma declaração para ir ao ar na rádio condenando o episódio;
– no início da tarde de sexta-feira, dirigentes do SJSP puderam agir diretamente numa situação de intimidação dentro do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC contra os jornalistas que estavam posicionados em uma área demarcada, dirigida especialmente contra uma colega da Band. Atuaram respondendo a quem gritava contra os jornalistas para preservar o espaço de trabalho dos profissionais. Agiram para impedir uma eventual tentativa de agressão, ajudados por Adriana Magalhães, secretária de comunicação da CUT São Paulo, e por trabalhadores do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC;
– pouco depois, diretores agiram novamente para barrar intimidações contra uma jornalista e um cinegrafista do SBT que gravavam uma passagem no mezanino acima, garantindo seu trabalho;
– na tarde de sábado, o plantão recebeu a denúncia de agressão ao jornalista C., da Jovem Pan, feito por outra jornalista da emissora que não estava no local. O diretor do SJSP avisado se deslocou para o local da denúncia, a rua lateral do edifício, não conseguiu na hora localizar o jornalista, mas permaneceu no local nas horas seguintes, pois o ambiente estava muito tenso;
– algum tempo depois, um dos diretores presenciou no local o momento em que uma jornalista de TV foi hostilizada por um casal, na rua lateral ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, e atuou para afastar os agressores, permitindo à equipe se reposicionar e continuar o seu trabalho;
– já no início da noite de sábado, o SJSP soube de denúncia de repórter do G1, afirmando que, assim que o portal publicou uma foto sua, feita no estacionamento, passou a ser perseguida e ameaçada por seguranças que ela acreditava serem do Sindicato dos Metalúrgicos (que, no entanto, não a identificaram). O diretor do SJSP presente ao local ligou para ela (que já tinha ido embora), colheu a denúncia diretamente e foi imediatamente falar com o diretor dos Metalúrgicos do ABC responsável pelos seguranças da entidade, e ele afirmou que a orientação era de respeitar o trabalho dos jornalistas. Pediu, inclusive, para incluir isso na nota do nosso SJSP, o que foi feito. Por outro lado, nos dois dias, testemunhamos vários casos de apoio dos seguranças do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC às equipes jornalísticas, coibindo agressões;
– no decorrer do período, diretores do SJSP conversaram ainda com outros jornalistas, do UOL, Estadão, EBC, Globo, G1 e da Rede TV que haviam sido hostilizados, expressando seu apoio e buscando formas de enfrentar a difícil situação, obtendo inclusive auxílio de seguranças em um momento de grande tensão. É claro que a atuação do SJSP, no palco dos acontecimentos, tem limites, e visou sobretudo a acalmar os ânimos, reduzir as tensões, contatar as entidades presentes e estar junto aos profissionais, para reforçar sua segurança.
O Sindicato dos Jornalistas foi sendo informado de diversas outras situações às quais não teve acesso direto, mas incorporou as informações em sua atividade, ao reforçar o plantão, se posicionar publicamente pelo microfone, em entrevistas ou notas, e debater com as entidades que dirigiam a atividade em São Bernardo do Campo para agirem em conjunto visando a segurança dos jornalistas presentes.
5. Os jornalistas são profissionais e seu trabalho tem de ser respeitado e garantido, bem como sua integridade física. Isso equivale à própria defesa da liberdade de imprensa e de expressão. A atuação dos repórteres de texto e de imagem é a essência do jornalismo. Eles não podem, em nenhum momento, ser confundidos com as empresas para as quais trabalham. O cotidiano dos profissionais é a batalha pelo jornalismo, e o jornalista tem como ambição exercer o jornalismo plenamente, mas, nas grandes empresas de comunicação, a liberdade de expressão só existe plenamente para o dono do veículo. As empresas recusam nas Convenções Coletivas as cláusulas de consciência, pela qual o jornalista teria o direito de não se vincular a matéria que contrarie sua consciência ou sua apuração dos fatos. Longe de ser uma cláusula que garante a liberdade de expressão, é um dispositivo apenas defensivo, que preserva o profissional. Mesmo assim, é recusado. Mas, além disso, as empresas querem até mesmo proibir que o jornalista se expresse fora de seu horário de trabalho, nas redes sociais, em petições públicas, em manifestações ou atos. Isso mostra que, para as empresas, a única liberdade de expressão que vale é a sua, e os profissionais, que não têm essa liberdade enquanto trabalham, também não podem exercê-la fora do emprego. Isso só reforça o quanto a crítica ou até o protesto contra as empresas em nenhum momento pode se confundir com qualquer julgamento em relação ao jornalista.
As empresas de comunicação detêm a plena liberdade de expressão quando se trata de seus veículos. Elas fixam suas linhas editoriais segundo suas convicções e seus interesses empresariais, e impõem essa linha aos jornalistas – por meio do poder diretivo vigente nas relações de emprego –, como todos que nelas trabalham sabem. Nos últimos anos, as grandes empresas de comunicação, em sua maioria, adotaram uma linha de legitimação do golpe, de acordo com seus interesses políticos e econômicos. Coerentemente, tentam se apoiar na reforma trabalhista de Michel Temer para precarizar ainda mais as condições de trabalho dos jornalistas, como vemos nas emissoras de rádio e TV, que decidiram esvaziar a Convenção Coletiva, com uma postura hostil contra os jornalistas como não vista há décadas.
Nos dias de hoje, as grandes empresas sucateiam o jornalismo ao demitirem em massa, reduzirem as redações e minarem as condições para o exercício da atividade jornalística, além de adotarem uma postura editorial de uma parcialidade política gritante. Nosso Sindicato, por isso, respeita plenamente o direito que as pessoas têm de protestarem contra as empresas de comunicação, mas sempre garantindo o respeito à integridade física e à liberdade de atuação do profissional de jornalismo.
6. Além disso, como entidade presente ao ato, o Sindicato expressou posições em relação à situação do país, o que também faz parte de seu papel institucional. O posicionamento do Sindicato dos Jornalistas no decorrer da atividade expressa suas posições consolidadas democraticamente nos fóruns da entidade, notadamente o último Congresso do Sindicato, realizado em 2017, com representantes eleitos em várias redações. De forma coerente com sua tradição democrática de décadas (na luta contra a ditadura militar, por exemplo), o SJSP tomou posição clara contra o golpe de Estado de 2016 e contra o Estado de Exceção, imposto pelo governo ilegítimo de Temer. Além de violentar a democracia e a vontade soberana da população, expressa nas urnas, entendemos o golpe como um instrumento para a demolição dos direitos trabalhistas no país, que atingem em cheio a nossa categoria, precarizando ainda mais as já difíceis condições de trabalho. Assim, lutamos contra o golpe e pela anulação das medidas de Temer, a começar pela reforma trabalhista.
Entendemos que o golpe foi fruto de uma ação realizada a partir das instituições do Estado, incluindo o Executivo, o Legislativo e o Judiciário – que age com frequência atropelando direitos democráticos e garantias constitucionais, como a presunção de inocência e o sigilo de fonte (direito democrático básico para o exercício do jornalismo). O processo contra o ex-presidente Lula que o levou à prisão, segundo diversos juristas, é marcado por uma gama de excepcionalidades, por uma clamorosa falta de provas, pela violação ao princípio do juiz natural, com um marcado objetivo político de alijar da disputa política o nome disparadamente majoritário nas preferências do povo brasileiro, e que encarna a resistência ao golpe, bem como a defesa de bandeiras ligadas à melhoria das condições de vida da população brasileira. Por isso, nossa posição democrática é de que a legitimidade da disputa eleitoral próxima está vinculada à presença de Lula na disputa, independentemente da posição de voto de cada cidadão. Não é uma posição partidária, mas sindical e ligada à defesa concreta dos interesses dos jornalistas, como cidadãos e como trabalhadores. O avanço do atual estado de exceção tem toda a relação com a escalada da violência e da perseguição (na maioria das vezes, institucional e policial) aos jornalistas que registramos em nosso trabalho sindical desde 2016.
7. Por tudo isso, é fundamental que o Sindicato possa exprimir as posições dos jornalistas diante da realidade social do país. Não é coincidência ser o nosso Sindicato marcado pela luta democrática radical, desde a ditadura até hoje: para ser exercido em sua plenitude, o jornalismo exige a democracia. Como entidade organizada, os posicionamentos da entidade se debatem e se constroem pela ampla participação dos jornalistas em seu seio.
O Sindicato é um instrumento dos jornalistas para a luta contra a violência, pela segurança do exercício profissional, e também para a defesa de suas condições de trabalho, duramente precarizadas pelas empresas, que, para isso, se apoiam diretamente nas medidas sob o governo ilegítimo de Temer. Quanto mais for valorizado pelos jornalistas profissionais e contar com sua participação, mais terá condições de cumprir o seu papel.
São Paulo, 9 de abril de 2018
Direção – Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP)