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Mãe negra impede censura a livro de cultura africana

Mãe negra impede censura a livro de cultura africana no Sesi

A mãe e professora de história Juliana Pereira viveu altos e baixos na última sexta-feira (16/3). Primeiro, sentiu esperanças quando participou, com centenas de pessoas, de um protesto que cobrava esclarecimentos para as mortes de Marielle Franco e Anderson Gomes, realizado em Volta Redonda, no interior do Rio de Janeiro. Momentos depois, a professora sentiu decepção ao voltar para casa e receber um comunicado das mãos de seu filho, aluno do Sesi de Volta Redonda. O texto da escola informava que, por conta do “questionamento de alguns pais em relação ao conteúdo”, o livro Omo-Oba: Histórias de Princesas (Mazza Edições, 2009), de Kiusam de Oliveira, havia sido abolido da grade de livros didáticos.

Incomodada com a decisão do Sesi de substituir um material que aborda temas da cultura afro-brasileira, a mãe publicou, no domingo (18), um texto no Facebook em que denunciou a censura ao livro e criticou a escola por ceder às pressões dos pais. “Não falo apenas pelos meus filhos negros, mas para além da necessidade imediata da visibilidade afro-descendente, precisamos formar pessoas que se sensibilizem e busquem uma sociedade mais justa”, escreveu. A postagem teve mais de 10 mil compartilhamentos.

A autora do livro, Kiusam de Oliveira, professora da Universidade Federal do Espírito Santo, também reagiu. “Agora estamos na era da caça às publicações que tratam da cultura afro-brasileira”, escreveu, num post em que contava em que foi professora de educação infantil por 23 anos e resolveu escrever um livro com “histórias de rainhas negras que fazem parte da história, da cultura e da humanidade” após testemunhar várias situações de confrontos de alunos negros com a ausência de príncipes e princesas como eles nas literaturas infantil e juvenil brasileira. “Pode parecer pouco, mas num país racista e eurocêntrico como o Brasil, tais princesas têm sido a defesa de crianças negras na luta contra a sua invisibilidade, a discriminação racial e o racismo. Ao Sesi que adotou o livro, parabéns, mas ao mesmo Sesi que o alterou no momento de manifestações contrárias sem que efetivamente tivesse exercido um papel educador e transformador eu digo, sinto muito.”

Mais gente apoiou a mãe e a escritora. “Ver assim o próprio colégio, uma escola como o Sesi, abraçando a raivosa estupidez que se funda disfarçada de fé e religiosidade é deprimente”, criticou o escritor Allan de Rosa. “Um verdadeiro desrespeito a lei 10.639/03 que obriga o ensino da história da África e das culturas afro-brasileiras nas escolas”, afirmou a Agência Solano Trindade.

Após as críticas, o Sesi se manifestou nesta segunda-feira (19/3) reconhecendo o erro. “A instituição vem a público reconhecer o equívoco no tratamento do assunto e informar que não mais será adotado um livro adicional [no lugar do Omo-Oba: Histórias de Princesas]”, afirmou em comunicado. “Para que equívocos como o ocorrido não se repitam, o Sesi irá realizar uma reciclagem com toda a sua equipe pedagógica”, acrescentou. A instituição também avisou que pretende levar o tema à comunidade, prometendo, “para breve”, um encontro “para debater com a comunidade escolar a diversidade e o multiculturalismo”.

A direção do Sesi de Volta Redonda fez uma reunião de pais, no mesmo dia, para tratar do tema. No encontro, outra mãe contou que também havia denunciado a escola nas redes sociais, embora sem a mesma repercussão.

Juliana disse à Ponte que o problema do preconceito vai além do Sesi, “é uma questão nacional”. Para ela, os debates sobre diversidade no Brasil ainda é muito “pobre” e as pessoas precisam se “instrumentalizar” mais para abordarem o tema.

Compromisso

Homologada no dia 20 de dezembro do ano passado, Base Nacional Comum Curricular (BNCC) se alinha à lei 11.645/08 que estabelece a obrigatoriedade da temática de história e cultura afro-brasileira e indígena no currículo das escolas.

A Base Nacional também determina que as instituições escolares devem “exigir um claro compromisso de reverter a situação histórica que marginaliza grupos”. Segundo o novo currículo do ensino, ainda é função das escolas “valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais”.

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