Do passado colonial às grandes metrópoles, das ferramentas utilizadas para a escravização de africanos às influências musicais de hoje, a exposição Ex Africa revela um continente efervescente e talvez ainda pouco conhecido.
Depois de passar por Belo Horizonte (MG) e pela cidade do Rio de Janeiro (RJ), onde foi visitada por mais de 200 mil pessoas, a exposição chega a São Paulo, onde fica até 16 de julho, com entrada gratuita.
O Centro Cultural Banco do Brasil foi o local escolhido para abrigar as cerca de 90 obras de artistas vindos de Gana, Senegal, Zimbábue, Angola, entre outros países do continente.
O curador da exposição, o alemão Alfons Hug, que foi diretor do Instituto Goethe em Lagos, na Nigéria, conta como o acervo pode surpreender quem ainda tem uma visão única com relação à produção africana.
“Tradicionalmente a arte africana era considerada muito próxima ao artesanato ou de peças etnográficas, um preconceito, o que temos hoje é uma linguagem de arte contemporânea mesmo. E ela é para mim uma das melhores que se encontra hoje no mundo”, diz.
O nome da exposição parte do frase “Ex Africa semper aliquid novi” que significa “de África sempre há novidades a reportar”, cunhada há mais de 2 mil anos pelo historiador romano Caio Plínio.
Dividida em quatro eixos temáticos –Ecos da História, Corpos e Retratos, O Drama Urbano e Explosões Musicais–, a mostra acentua os laços ancestrais com a história do Brasil e desnuda um continente que se reconstruiu após a colonização de maneira diversa e desigual.
Hug aponta que algumas obras trazem inclusive retratos de uma África próspera, muito antes do continente ser sistematicamente saqueado e destruído.
“A África do século 16, 17 e 18, na Europa, era associada a riqueza e prestígio e vários reis alemães, duques e barões se vestiam como africanos. Então essa noção da miséria africana vem muito mais tarde, provavelmente do século 19. Historicamente, a África era um lugar de luxo e prestígio”, pondera.
Ao lado do senegalês Omar Victor Diop, conhecido pelos retratos fotográficos posados, o sul-africano Mohau Modisakeng, que discute por meio de uma video-instalação as marcas deixadas pelo apartheid, e o nigeriano Jelili Atiku, estão dois brasileiros. Arjan Martins e Dalton Paula exibem obras produzidas ao longo de uma pesquisa realizada em um bairro brasileiro em Abuja, capital da Nigéria.
“Ex Africa acontece em um momento em que o Brasil está reavaliando a herança africana em todos os eixos, político, econômico, social e cultural, e apesar de todos os problemas que possam existir, eu diria que existe um certo avanço nas artes visuais que tradicionalmente são um domínio da classe média branca, onde os artistas afrodescendentes conquistaram espaços nos últimos 10, 15 anos”, avalia.
Outro domínio que não é apontado por Hug é o masculino nas artes. Se há um ponto negativo a se levantar é, sem dúvidas, a ausência de mulheres africanas ou brasileiras na exposição. Há apenas uma mulher entre os artistas; questionado pelo Brasil de Fato sobre a obra de Ndidi Dike – a única mulher – , o curador explicou que considera o trabalho “bastante masculino e até mesmo violento”.
A nigeriana Dike, expõe feridas de um passado ainda recente ao trazer para o centro da sua obra objetos do tempo do comércio de escravos como algemas, moedas e anúncios onde pode-se ler: “vendem-se negros”.