Apesar de mais de 45 milhões de brasileiros terem algum tipo de deficiência – quase 25% da população -, segundo o Censo do IBGE de 2010, e uma Lei de Cotas (821/91) que prevê a contratação de trabalhadores e trabalhadoras com deficiência e reabilitados pelo RGPS (Regime Geral da Previdência Social), empresas ainda insistem em tentar burlar a legislação. Alguns casos chegam a Justiça e empresas são condenadas por não cumprimento da lei que tem 27 anos.
Foi o que aconteceu com Construtora Fontanive Ltda, no Paraná, condenada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) a pagar R$ 50 mil reais de indenização por danos morais coletivos por discriminação contra trabalhadores e trabalhadoras com deficiência. Para se defender, a construtora entrou com um recurso alegando que não conseguiu cumprir a lei porque faltam pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Não cumpriu a lei e ainda mentiu para se defender, na opinião de um dos coordenadores Nacional do Coletivo de Trabalhadores e Trabalhadoras com Deficiência na CUT e bancário, José Roberto Santana da Silva.
“É mentira, uma falácia bastante conhecida, dizer que falta trabalhadores com deficiência para as vagas. Os trabalhadores e as trabalhadoras com deficiência e reabilitados quando chegam aos processos seletivos são cortados antes de serem avaliados”.
Segundo José Roberto “o que falta é sensibilidade dos empresários em perceber que as pessoas com deficiência também são formadas, mestres e pós-graduadas, portanto aptas a se candidatarem para inúmeras funções”.
“A condição destes trabalhadores é vista pelos empresários como falta de capacidade por puro preconceito”, denuncia.
A legislação estabelece que, se a empresa tem entre 100 e 200 funcionários, deve destinar 2% das vagas a beneficiários reabilitados e pessoas com deficiência. Este percentual pode chegar a um máximo de 5% caso haja mais de 1.001 funcionários.
Segundo a RAIS (Relação Anual de Informações Sociais), a contratação de pessoas com deficiência não chega a 1% dos registros em carteiras. Dos 46 milhões de brasileiros com carteira assinada, 418.521 são trabalhadores com deficiência e reabilitados.
A secretária nacional de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara, diz que além da dificuldade que uma pessoa com deficiência tem para ser selecionada para uma vaga de trabalho, a falta de acessibilidade e condições de trabalho também prejudicam o cumprimento da lei.
“As empresas ainda não oferecem ambientes acessíveis, as cidades ainda não oferecem serviços de transporte acessível de qualidade, a oferta de ensino profissionalizante inclusivo ainda é praticamente inexistente, entre outros”, diz Jandyra, que alerta: “Com os ataques ofensivos do governo golpista e ilegítimo de Michel Temer contra a classe trabalhadora, o cenário é pior nas contratações destes trabalhadores”.
A reforma Trabalhista e a Lei da Terceirização ilimitada dificultam ainda mais o cumprimento da Lei de Cotas de trabalhadores e trabalhadoras com deficiência e reabilitados, já que o Estatuto da Pessoa com Deficiência só conta para a cota pessoas com deficiência contratadas de forma direta pelo empregador.
“Com a reforma Trabalhista e a terceirização irrestrita, aprovadas neste governo golpista, as empresas podem contratar de outras maneiras e dificultam a cobrança e as denúncias contra empresas que não cumprem a cota”, explica Jandyra.
A secretária de Políticas Sociais e Direitos Humanos da CUT reafirma a importância dos sindicatos em combater o ataque ofensivo de retirada de direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras em todos os setores e situações previstas no mercado de trabalho.
“As negociações coletivas nas datas bases de cada ramo, categoria ou grupo econômico, é um momento privilegiado para incluir garantias de cumprimento da legislação referente à inclusão das pessoas com deficiência no trabalho”.
Segundo Jandyra, muitas categorias já possuem cláusulas em suas convenções, mas, em face de atualização da legislação, é necessário adequar os textos, inclusive a terminologia. A dirigente destaca o papel da CUT em defesa da classe trabalhadora:
“A CUT atua junto aos órgãos competentes, cobrando a intensificação da fiscalização de todas as formas de violação, de precarização da força de trabalho das pessoas com deficiência, e organizando estes trabalhadores e trabalhadoras nas suas bases e ramos porque entende que essas lutas específicas não estão descoladas de nossas lutas gerais. São parte de uma luta mais ampla, por direitos humanos, em defesa dos interesses imediatos e históricos da classe trabalhadora, pela construção de uma sociedade justa, igualitária e inclusiva”, finaliza.
O que diz a empresa?
Procurada pelo Portal da CUT, a Construtora Fontanive Ltda, no Paraná, disse que já cumpre a Lei de Cotas para Trabalhadores com Deficientes, porém não divulgou nem o número de contratados e nem o número total de trabalhadores e trabalhadoras na empresa.
Sobre o processo
O processo está no Ministério Público do Trabalho (MPT) no Paraná e só irá se manifestar caso a empresa volte a entrar com recursos. Portanto, a causa foi uma grande conquista dos trabalhadores e das trabalhadoras com deficiência.