O Coletivo da Mulher Jornalista do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo participa nesta sexta-feira, dia 20 de janeiro, do protesto contra a Globo no caso BBB. A atividade organizada pela Frente Paulista pela Liberdade de Expressão e pelo Direito à Comunicação (Frentex), pelo Fórum Nacional pela Democratização na Comunicação (FNDC) e pela Rede Mulher e Mídia ocorrerá, às 12h, em frente da TV Globo (Av. Dr. Chucri Zaidan, esquina da Av. Roberto Marinho).
Em nota, as entidades afirmam que “frente a indícios de um possível abuso sexual contra uma mulher participante de um de seus principais programas, a Globo, além de não impedir a violência no momento em que ela poderia estar ocorrendo, tentou escamotear o fato, depois buscou tirar de circulação as imagens e finalmente assumiu o ocorrido sem nomeá-lo”.
Leia abaixo a íntegra da nota:
Pela imediata responsabilização da TV Globo no caso BBB
Dois fatos muito graves ocorreram esta semana envolvendo o Big Brother Brasil. O primeiro foi com a participante Monique, que pode ter sido vítima de crime praticado por outro integrante do programa.
O segundo foi a absurda atitude da TV Globo frente ao ocorrido. Em relação ao primeiro, cabe à polícia apurar e à justiça julgar, buscando ouvir os envolvidos, garantindo que eles estejam livres de pressões e constrangimentos. Já em relação ao segundo, é preciso denunciar a emissora e os anunciantes que sustentam o programa, e cobrar as autoridades do setor. Frente a indícios de um possível abuso sexual contra uma mulher participante de um de seus principais programas, a Globo, além de não impedir a violência no momento em que ela poderia estar ocorrendo, tentou escamotear o fato, depois buscou tirar de circulação as imagens e finalmente assumiu o ocorrido sem nomeá-lo.
Na edição de domingo do programa, após todas as denúncias que aconteciam pela internet, ela transformou a suspeita de um crime em uma cena “de amor”. O espírito da coisa foi resumido pelo próprio apresentador Pedro Bial: “o espetáculo tem que continuar”. A atitude é inaceitável para uma emissora que é concessionária pública há 46 anos e representa uma agressão contra toda a sociedade brasileira. Pelas imagens publicadas, não é possível dizer a extensão da ação e saber se houve estupro. A apuração é fundamental, mas o mais importante é o que o episódio evidencia.
Em primeiro lugar, a naturalização da violência contra as mulheres, que revela mais uma vez a profundidade da cultura machista no país. No debate público, foram inúmeras as tentativas de atribuir à possível vítima a responsabilidade pela agressão, num discurso ainda inacreditavelmente frequente. O próprio diretor do programa, Boninho, negou publicamente que as imagens apontassem para qualquer problema. Em segundo lugar, o episódio revela o ponto a que pode chegar uma emissora em nome de seus interesses comerciais.
A Globo fatura bilhões de reais anualmente pela exploração de uma concessão pública, e mostra, com esse episódio, a disposição de explorá-la sem qualquer limite nem nenhum cuidado com a dignidade da pessoa humana. O próprio formato do programa se alimenta da exploração dos desejos e das cizânias provocadas entre os participantes e busca explorar situações limite para conquistar mais audiência. Assim, o que aconteceu não é estranho ao formato do programa; ao contrário, é exatamente consequência dele.
Em terceiro lugar, fica evidente a ausência de mecanismos de regulação democrática capazes de apurar e providenciar ações imediatas para lidar com as infrações cometidas pelas emissoras. Como já vem sendo apontado há anos pelas organizações que atuam no setor, não há hoje regras claras que definam a responsabilidade das emissoras em casos como esse, nem tampouco instrumentos de monitoramento e aplicação dessas regras, como um Conselho Nacional de Comunicação ou órgãos reguladores. Uma das poucas regras existentes para proteger os direitos de crianças e adolescentes – a classificação indicativa – está sendo questionada no STF, inclusive pela Globo.
A emissora, que costuma tratar qualquer forma de regulação democrática como censura, é justamente quem agora pratica a censura privada para esconder sua irresponsabilidade. É lamentável que precise haver um fato como esse para que o debate sobre regulação possa ser feito publicamente.
Frente ao ocorrido, exigimos que as Organizações Globo e a direção do BBB sejam responsabilizados, entre outros fatos, por:
– Ocultar um fato que pode constituir crime;
– Prejudicar a integridade da vítima e enviar para o país uma mensagem de permissividade diante de uma suspeita de estupro de uma pessoa vulnerável;
– Atrapalhar as investigações de um suposto crime;
– Ocultar da vítima as informações sobre os fatos que teriam se passado com ela quando estava supostamente desacordada.
É preciso garantir, no mínimo, multas vultuosas e um direito de resposta coletivo para as mulheres, que mais uma vez tiveram sua dignidade atingida nacionalmente pela ação e omissão da maior emissora de TV brasileira.
Os anunciantes do BBB – OMO (Unilever), Niely Gold, Devassa (Schincariol), Guaraná Antártica e Fusion (Ambev) e FIAT – também devem ser entendidos como co-responsáveis, e a sociedade deve cobrar que retirem seus anúncios do programa ou boicotá-los. Suas marcas estão ligadas a um reality show que, para além de toda a crítica sobre os valores que propaga à sociedade – da banalização do sexo e do consumo de álcool à mercantilização dos corpos – , permite a violação de direitos fundamentais. Finalmente, é fundamental que o Ministério das Comunicações coloque em discussão imediatamente propostas para um novo marco regulatório das comunicações, com mecanismos que contemplem órgãos reguladores democráticos capazes de atuar sobre essas e outras questões.
Este é mais um caso cujas investigações não podem se restringir à esfera privada e à conduta do participante suspeito. Exigimos que o Poder Executivo cumpra seu papel de fiscal das concessionárias de radiodifusão e não trate o episódio com a mesma “naturalidade” dada pela TV Globo.
Esperamos também que o Ministério Público Federal se coloque ao lado da defesa dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana e responsabilize a emissora pela forma como agiu diante de uma questão tão séria como a violência sexual contra as mulheres.
Brasil, 18 de janeiro de 2012
FNDC – Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
Rede Mulher e Mídia Articulação de Mulheres Brasileiras
Campanha pela Ética na TV Ciranda
Coletivo Feminino Plural
Observatório da Mulher Associação
Mulheres na Comunicação – Goiânia COMULHER
Comunicação Mulher HUMANITAS –
Diretos Humanos e Cidadania
Marcha Mundial das Mulheres
Rede Feminista de Saúde
Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
SOF – Sempreviva Organização Feminista
SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia