O ato público “Temos lado no 2º turno! Pela democracia e direitos!” lotou o auditório Vladimir Herzog na noite desta terça-feira (23) com jornalistas, sindicalistas, militantes e intelectuais de várias áreas e diferentes gerações, todos e todas unidos em defesa da democracia, em evento realizado pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) no centro paulistano.
“Todos sabem que Bolsonaro é uma usina de fake news, e uma das maiores mentiras que ele conta é de que é um candidato patriótico, mesmo sendo a favor de entregar o petróleo e outras riquezas do país às multinacionais para livre exploração. É preciso desmascarar Bolsonaro porque ele representa a continuidade do governo golpista de Michel Temer, que destruiu direitos trabalhistas, privatizou patrimônio público, entregou petróleo a multinacionais e liquidou o serviço público”, disse Paulo Zocchi, presidente do Sindicato.
Em nota, o SJSP já expressou seu posicionamento contrário à possibilidade de ascensão de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República. No texto, a entidade deixa claro que “os compromissos de nossa entidade com a sua própria história, com os interesses diretos de nossos representados e com as liberdades democráticas nos fazem rejeitar de forma cabal a possibilidade de ascensão do capitão reformado à Presidência da República. No atual momento, vemos a candidatura de Fernando Haddad como forma de defender a democracia no Brasil.”
Zocchi criticou os ataques de Bolsonaro à liberdade de imprensa e o incentivo à perseguição de seus adversários, “com atos de violência se espalhando pelo país e que também atinge jornalistas, com uma intolerância aberta e declarada a qualquer crítica e à mera divulgação de notícias que não interessem a esse candidato ou ao grupo dele”, afirmou.
Durante o ato público, foi lançado o Mapa da Violência Política no Brasil, que reúne casos de violência com motivação política ocorridos desde o dia 7 de outubro. As estatísticas da plataforma interativa mostram que os casos se concentram nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, mas ocorrem também nos rincões do país onde há subnotificação devido ao medo das vítimas de denunciarem.
Momento é de unidade
Para o jornalista e cientista político Paulo Vannuchi, ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, “a hora é de chamar o máximo possível de unidade. Além do trabalho heroico de conquistar votos, o que cada um de nós pode fazer nesses dias é cobrar posições. Não se posicionar a favor da democracia neste momento é cometer crime de lesa biografia”, afirmou, destacando aos participantes do ato que cobrassem o posicionamento e o apoio de figuras como Ciro Gomes (PDT), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Marina Silva (Rede Sustentabilidade) à campanha de Haddad (PT).
Representando a CUT São Paulo, o secretário de Mobilização da Central, João Batista Gomes, avalia que não é à toa que a “reforma” trabalhista é um dos resultados do golpe à democracia pelo governo ilegítimo de Michel Temer, assim como o ataque frontal à organização dos trabalhadores que retirou direitos e o financiamento dos sindicatos. Ele alertou para o problema do assédio sofrido por trabalhadores, praticado por patrões pressionado pelo voto em Bolsonaro alegando risco de fechamento de empresas e desemprego.
“É um ataque direto ao conjunto dos trabalhadores, com o judiciário acovardado porque não enfrenta a situação e não se coloca à altura necessária para enfrentar o que está acontecendo, a começar pelas fake news, mas também pelos ataques aos direitos trabalhistas”, afirmou o secretário cutista, completando: “Estamos do lado da democracia e dos direitos, e daqui até domingo temos todas as condições de virar voto e vencer essas eleições porque é possível vencer esse farsante do Bolsonaro. Sem democracia não há direitos e sem direitos não há democracia”.
Tortura nunca mais
Durante o ato público, Zocchi prestou homenagem ao jornalista Audálio Dantas, ex-presidente do SJSP que morreu em maio e foi um lutador intransigente pela democracia e contra a ditadura.
Lembrando que há 43 anos o Sindicato luta pela apuração e punição dos responsáveis pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog, morto sob tortura em 1975 pelos agentes do Doi-Codi, o presidente do SJSP também criticou a apologia à tortura pelo candidato do PSL.
“Temos um candidato que apoia a tortura e lamenta pelo ‘baixo’ número de assassinatos pelo regime militar. Chegamos ao ponto de ter de lembrar, não só a opinião pública, mas a parentes, a amigos, a pessoas que encontramos nas ruas, que a tortura é um crime hediondo e imprescritível, e um defensor da tortura não pode ter lugar na vida democrática do nosso país”, destacou o presidente do SJSP.
Com mais de 60 anos de profissão, a veterana jornalista Rose Nogueira, da Comissão de Ética dos Jornalistas de São Paulo e membro do grupo Tortura Nunca Mais-SP, foi presa política durante o regime militar de 1964. Emocionada, ela compartilhou o relato de sua experiência nos porões do Dops, onde foi presa e torturada cerca de 20 dias depois do parto de seu único filho, e criticou a relativização da barbárie propagada pelo candidato do PSL.
“Quando se ouve falar em tortura, pessoas que, como eu, passaram pelas salas do Dops, que conheceu de perto o delegado Fleury e que tenho uma sequela perpétua de nunca mais poder ter filhos, eu sou essa pessoa. Mas outros passaram por coisas muito piores que vi e acompanhei. Quando alguém fala que defende a tortura, para mim é quase a morte. Não acredito que ainda se possa ouvir isso ou que o Brasil possa ouvir com essa serenidade como aconteceu e ninguém coibiu”, disse a jornalista.
Rose lembrou que a tortura é um crime universal de lesa humanidade, imprescritível e inafiançável, e criticou a decisão do Tribunal do Justiça do Estado de São Paulo, que neste dia 17, acatou o recurso da defesa do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, condenado em 2012 pela morte do jornalista Luiz Eduardo Merlino, assassinado em 1971, outra vítima de tortura pelos agentes do regime militar nas dependências do Doi-Codi. Ustra morreu em 2015 sem ser condenado por nenhum dos crimes que cometeu.
Declarando seu voto em Fernando Haddad, o jornalista Oswaldo Faustino, da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial do SJSP (Cojira-SP), ressaltou as lutas democráticas do povo negro, criticou a invisibilidade tanto dos jornalistas negros e negras nas redações quanto das pautas de questões raciais na mídia brasileira, e disse que faz parte de um segmento da sociedade “para o qual o cativeiro nunca acabou”.
Faustino alertou ainda que, no cenário atual, com as afirmações racistas feitas pelo candidato do PSL, o povo negro está sendo ameaçado “e agora as pessoas têm orgulho de se dizer racistas, por isso sabemos de que lado temos que estar, e é do lado da democracia. Foram em poucos momentos de liberdades democráticas que conseguimos respirar e colocar o nariz para fora dos buracos em que fomos enterrados. Infelizmente, esses momentos não acabaram com o genocídio da juventude negra, mas se tivermos racismo, aí acabaram-se nossas esperanças”, concluiu.
Também participaram do ato público Alceu Castilho, Antônio Martins, Eleonora de Lucena , Gabriel Romeiro, Eugênio Bucci, Fábio Venturini, Igor Fuser, José Américo, Laura Capriglione, Laurindo Lalo Leal Filho, Maria Inês Nassif , Miro Borges, Mônica Zarattini, Patrícia Zaidan, Paulo Canabrava, Paulo Moreira Leita, Pedro Pomar e William de Lucca, entre outros.
Participaram ainda representantes Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira), a Comissão de Justiça e Paz de São Paulo, a Central Única dos Trabalhadores de São Paulo, o Centro Acadêmico Vladimir Herzog da Faculdade Cásper Líbero, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe-SP), a Federação Nacional dos Jornalistas, o Grupo Tortura Nunca Mais-SP e o Partido dos Trabalhadores, entre outras entidades.