O Ministério Público do Trabalho (MPT) propôs um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) à Editora Abril contra demissões em massa na empresa sem negociação prévia com o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP). O documento foi apresentado nesta quinta-feira (8) pela procuradora do Trabalho Lorena Vasconcelos Porto, em reunião na Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, na capital paulista, com a direção da empresa, representantes do SJSP e do Sindicato Empregados da Administração das Empresas Proprietárias de Jornais e Revistas de São Paulo.
O TAC é resultado de um procedimento aberto pelo MPT para apurar uma denúncia anônima contra a empresa, que demitiu centenas de trabalhadores administrativos e jornalistas desde dezembro de 2017 sem que houvesse uma negociação real com os sindicatos das categorias no sentido de garantir contrapartidas aos trabalhadores e trabalhadoras e, ainda, com o parcelamento das verbas rescisórias em dez vezes, o que fere a legislação trabalhista.
O documento proposto pelo MPT estabelece o pagamento integral das verbas rescisórias e em parcela única, com homologação no Sindicato, independentemente do tempo de contrato; pagamento de 2,5 salários nominais como indenização a cada trabalhador dispensado; extensão do plano de saúde por seis meses a partir da data de demissão; garantia de um programa de recolocação, com consultoria que ajude os trabalhadores a voltarem ao mercado em postos compatíveis com suas funções; prioridade de contratação dos dispensados em caso de novas contratações, e agendamento de uma reunião entre a direção da Abril e os sindicatos dos profissionais para discutir o “futuro dos negócios específicos de seu segmento e o impacto nas relações de trabalho em face da conjuntura atual”.
Em caso de assinatura e descumprimento do TAC, a Editora Abril seria penalizada com multa diária de R$ 20 mil por trabalhador atingido. A empresa tem um prazo de dez dias para se manifestar quanto ao TAC e, caso a editora não assine o termo, o MPT vai ajuizar uma ação civil pública que, após julgamento do mérito, pode obrigar a Abril a cumprir o que o termo determina.
Caso o termo seja assinado pela editora, o MPT vai acompanhar o cumprimento do TAC diretamente ou por meio de fiscalização do Ministério do Trabalho.
Negociação prévia com sindicato é necessária mesmo com a “reforma” da CLT
Na reunião com o MPT, os advogados da Abril tentaram argumentar que a empresa teria, sim, negociado as demissões, mas que nem todas as negociações resultaram em acordo. Eles alegaram, ainda, que após novembro passado, quando entrou em vigor a “reforma” trabalhista, a nova legislação derrubou a obrigatoriedade de diálogo prévio com o Sindicato.
Porém, segundo a procuradora Lorena Vasconcelos Porto, apesar da “reforma” da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), é outro o entendimento do MPT e de outras instâncias da Justiça do Trabalho quanto à necessidade de negociação prévia de demissões em massa.
“A CLT [reformada] veio trazer a previsão de que a autorização do sindicato não é necessária [para demissão coletiva], mas essa autorização nunca se requereu. O que se requer é a negociação coletiva e não a autorização do sindicato, até porque essa autorização não se exige em nenhum país. A exemplo de outros países, civilizados e democráticos, o que se exige é a negociação coletiva prévia com o sindicato, o que neste caso não houve, considerando as manifestações e os documentos juntados”, disse a magistrada.
A procuradora destacou, ainda, que a negociação prévia exige concessões recíprocas, o que não ocorreu, pois a editora impôs um acordo sem contrapartidas e sem a busca de caminhos como um Plano de Demissão Voluntária.
No diálogo com o Ministério Público do Trabalho, Paulo Zocchi, presidente do SJSP, reforçou que a negociação não ocorreu de fato porque a empresa foi irredutível quanto à proposta das demissões. “Os donos da Abril são bilionários, estão em recente lista da revista Forbes, acumularam patrimônio ao longo de anos às custas de seus trabalhadores e por isso não era possível aceitar um acordo que prejudicasse ainda mais os que já estavam perdendo o emprego”, afirmou o sindicalista.
Único sindicato a não aceitar o fechamento de um acordo com a editora, o SJSP avalia o TAC como uma conquista importante, pois deixa claro aos patrões que, mesmo com a “reforma” da CLT, não poderão impor demissões em massa, nem acordos que prejudiquem os trabalhadores.
Entenda o caso
O Sindicato dos Jornalistas foi procurado pela direção da Abril em setembro de 2017, quando a empresa procurou a entidade para comunicar possíveis demissões.
Após assembleia reunindo cerca de 50 profissionais no mesmo mês, a editora fez nova reunião com o SJSP propondo, entre outros termos, que a dispensa coletiva ocorresse com parcelamento das verbas rescisórias em até 10 vezes, extensão do plano de saúde por apenas um mês além do período de aviso prévio, extensão do vale alimentação por seis meses e compromisso de que as demissões seriam homologadas no Sindicato mesmo após a entrada em vigor da reforma da CLT.
Em nova assembleia, em outubro, os jornalistas da Abril rechaçaram os termos propostos pela editora e construíram uma contraproposta reivindicando, entre outros, a abertura de uma consulta interna sobre os profissionais que queriam ser demitidos e num acordo válido para no máximo 20 demissões, com pagamento em até cinco parcelas e adicional de 10% sobre o valor da rescisão a título de correção pelo parcelamento, além da multa de um salário prevista no artigo 477 da CLT nos casos de atraso na quitação das verbas.
A contraproposta, porém, foi recusada pela direção da Abril. Diante da inflexibilidade da empresa em negociar melhores condições, o SJSP não aceitou fechar um acordo que prejudicasse os jornalistas e, em dezembro de 2017, a empresa iniciou à revelia a dispensa em massa.
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