Logo do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo
Logo do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo
Logo da Federação Internacional de Jornalistas
Logo da Central Única dos Trabalhadores
Logo da Federação Nacional de Jornalistas

Jornal Unidade: Costa também foi torturado no Doi-Codi

Jornal Unidade: Costa também foi torturado no Doi-Codi


 

luizsite

O jornalista Luiz Paulo Costa, de 71 anos, é um dos depoentes da Comissão Verdade do SJSP. Sindicalista e membro do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e, posteriormente, do MDB em São José dos Campos, foi preso quando trabalhava no Instituto Técnico Aeronáutico (ITA). Durante anos, sem ter qualquer processo contra ele, foi perseguido e torturado no DOI.

Em 1970, eu era secretário do MDB e por ter participado de uma reunião com estudantes que tentavam reorganizar o Partido Comunista em São José dos Campos, o pessoal do DOI-Codi foi até a minha casa me prender com a justificativa de que eu era o assistente político da célula comunista.

Entraram três homens vestidos a paisana, armados e me levaram para prestar depoimento. Entrei no carro e logo fui algemado. Quando chegamos a São Paulo me colocaram um capuz, me conduziram até uma sala e pediram para eu segurar dois fios, deram choques. Como não falei nada argumentaram entre eles: essa pimentinha não está resolvendo nada.

E desceram comigo para outro cômodo. E fui para a chamada cadeira do dragão. Eles me fizeram tirar a roupa, me amarraram, colocaram fios nas partes mais sensíveis do meu corpo e começaram a disparar choques muito violentos.

A tortura começou à noite e entrou madrugada adentro. Quando me tiraram da cadeira eu não consegui vestir a minha própria roupa por impossibilidade física. Mesmo assim vesti uma calça e uma japona cinza. Eu já não me levantava mais, não conseguia ficar em pé.

Colocaram-me em um colchão e me arrastaram até um salão onde havia mais gente. Tudo isso sempre encapuzado. Como estava muito mau, o Sérgio Gomes (jornalista) se revoltou com a minha situação e pediu um médico. Então, me tiraram e levaram para uma cela, onde havia outros dois jornalistas, o Frederico Pessoa e o Polá Galé e um ferroviário que também estava em situação precária porque era epilético.

Haviam três turmas de torturadores. Uma que entrava no domingo e saia na quarta. Os mesmos que haviam me torturado no domingo retornaram na quarta. Um deles pisou nas minhas costas e disse: nós ainda vamos conversar. Fui atendido por um médico – que também estava preso – que disse que eu não tinha condições de ficar ali e que precisava ser removido para um hospital. Mas continuei lá.

Essa mesma turma de torturadores pegou o Vladimir Herzog no sábado. A gente sempre ouvia os gritos e eles aumentavam o volume do rádio para disfarçar. Na segunda-feira, me levaram pra outra sala onde havia um tal de “Dr. Paulo”. Os subordinados dele pediram pra eu assinar um documento, que era uma confissão. Eu disse que não. Ai me deram uma folha para eu escrever o que eu achava. Escrevi uma lauda e meia, eles levaram para o “Dr. Paulo” e voltam com resposta de que ainda não estava bom , que tinha que escrever mais. Eu disse que só podia escrever aquilo. Eles disseram: então você vai viajar!

Fui colocado deitado na parte de trás da Veraneio (carro) porque eu não conseguia me levantar e me levaram de volta para São José dos Campos. Isso era um domingo depois da morte do Vlado no sábado.

Fui deixado na casa da minha sogra. Entrei e logo fui levado para o Hospital Beneficência Portuguesa, onde fui internado. Então apareceu um cirurgião que se apresentou como médico da Aeronáutica. Ai pensei: estou ferrado.

Ele perguntou o que havia acontecido. Eu disse que tinha caído de uma escada e que tinha problema na coluna. E nisso estacionaram uma veraneio em frente à janela do quarto onde eu estava internado, que permaneceu lá todo tempo. Naquele momento, estava ocorrendo o culto ecumênico na Praça da Sé.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, através do Audálio Dantas e o próprio Paulo Jair Soares, informaram o Estadão e o doutor Rui Mesquita ligou para o Ministro da Justiça. Ele disse que se eu morresse no DOI-Codi, a responsabilidade seria deles porque eu estava muito mal. Isso depois da morte do Herzog, que teve grande repercussão.

Eu passei duas semanas no Hospital Beneficência Portuguesa e depois fui para o Hospital das Clínicas para ser tratado no setor de ortopedia.

Fui chamado para depor na Justiça Militar, na Auditoria Militar, porque tinha um processo aberto contra os alunos. Eu não fui indiciado no processo.

Eu retomei minha atividade no Estadão, em 1976. Fui lançado candidato a vereador, porque pensei que seria importante me tornar uma pessoa pública.  E me elegi. A Arena pediu a minha cassação, mas como eu não tinha perdido os direitos políticos, eles não conseguiram. Mesmo assim, eles pediram para o Governo Federal que eu fosse cassado com base no Ato Institucional (AI5).

 

* Matéria publicada no Jornal Unidade, edição 364. Foto.: André Freire

veja também

relacionadas

mais lidas

Pular para o conteúdo