Paulo Freire em Pedagogia do Oprimido afirma que o radical “não teme enfrentar, não teme ouvir” e que em relação aos oprimidos “com eles se compromete, dentro do tempo para com eles lutar”. Nathalia Urban era dessas jornalistas que não tinham medo de lutar nem de se comprometer com os oprimidos, uma qualidade rara em um jornalismo onde tomar partido muitas vezes é visto com maus olhos. E não foi pouca a comoção que ela causou nos telespectadores da TV 247 com sua partida.
Nos comentários das lives de homenagens, as pessoas que tomavam café da manhã enquanto assistiam às suas lives sobre política lamentaram a perda e afirmavam ter aprendido muito com Nathalia sobre o Sul global e a luta de classes.
Mas afinal quem era a “jovem e impetuosa” jornalista, como a chamava Celso Amorim, ex-ministro de Relações Exteriores? Nascida em Santos, litoral de São Paulo, em 25 de dezembro de 1987, ela morou em João Pessoa, onde iniciou os estudos em antropologia na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Ao retornar a São Paulo, estudou ciências sociais na PUC. Foi aí que percebeu que gostava mesmo era do trabalho de campo.
Segundo ela própria afirmou, “queria fazer uma coisa que fosse fazer diferença mais rapidamente na vida das pessoas” e, por isso, decidiu-se pelo jornalismo, que cursou na Universidade Católica de Santos (UCS). Uma curiosidade é que a avó a incentivou a fazer jornalismo acreditando que ela trataria de “assuntos mais leves, como moda”, mas Nathalia gostava mesmo era de política.
Todas as manhãs Nathalia levava ao público da TV 247, no “Veias Abertas”, análises de temas internacionais e da América Latina. O programa com nome que remetia ao livro clássico de Eduardo Galeano, contando com uma brasileira, latina e globalista à frente das entrevistas, fazia com que os telespectadores entendessem os impactos dos mais diversos temas, como as eleições na Venezuela, o golpe na Bolívia, a Argentina sob o desastroso governo Milei e muito mais. Temas que não são vistos na mídia hegemônica e que se tornavam simples e acessíveis pela forma como Nathália tocava as entrevistas.
Foi para a Europa em 2013, inicialmente morou em Londres, quando se deparou com a xenofobia, mudando-se para a Escócia pouco tempo depois. Lá, ela se envolveu na luta de independência do país e também pelos direitos dos imigrantes e das trabalhadoras sexuais, enquanto manteve um intenso diálogo com o movimento de libertação da Irlanda e da luta pela “Segunda Independência” da América Latina.
Ela se destacou na cobertura da luta do povo palestino contra o genocídio em Gaza, na qual se envolveu de corpo e alma, sobretudo nos últimos meses, sendo vítima de ataques e ameaças, o que não a impediu de seguir uma linha corajosa e contínua de denúncias.
Generosa, Nathalia construiu uma ampla rede de interlocutores internacionais, estabelecendo diálogos preciosos na TV 247 com a revista Jacobin, Revista Fórum, Opera Mundi e toda a mídia progressista. Com seu carisma e alegria, cativava a todos. Nathalia se entendeu feminista, ao viver a experiência de ser filha de mãe “solo”. A mãe morreu aos 38 anos com câncer ósseo.
Atualmente Nathalia vivia em Edimburgo, na Escócia, onde faleceu aos 36 anos, no dia 25 de setembro, em decorrência de um acidente que ainda está sendo investigado.
Nathalia Urban, presente!