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O jornalismo como profissão em movimento

O jornalismo como profissão em movimento


 

celso schoreder 2 lidyane ponciano

 

Especialistas analisam o mercado de trabalho com  a crise no segmento de jornais e revistas

 

O ano de 2015 promete ser de muita luta e resistência. Em nível mundial, ele já trouxe um grave ataque à liberdade de expressão com o massacre de jornalistas e funcionários do jornal francês Charlie Hebdo, por parte de extremistas islâmicos. No Brasil houve, no princípio do ano, uma série de demissões nas redações dos grandes e pequenos veículos de comunicação de vários Estados, o que torna necessário o maior engajamento da categoria nas lutas pelos direitos dos trabalhadores e em defesa do Jornalismo.

Em São Paulo, por exemplo, em 2014, houve 947 homologações no Departamento Jurídico do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP). Foram 499 demissões por justa causa, 438 de pedidos de dispensa, 9 por encerramento de contrato (não renovado) e uma aposentadoria. Proporcionalmente, os impressos (jornais e revistas) foram os que mais dispensaram trabalhadores. O encerramento da versão impressa do Diário do Comércio e a extinção de títulos na editora Abril engrossaram os números de demissões. Em TV, as dispensas foram em menor escala, assim como na internet.

Os números, apesar de elevados, são menores do que os registrados em 2013 (1.237 demissões) e um pouco mais altos do que os de 2012 (863). Em 2011, houve 902 dispensas de jornalistas e o menor dos últimos 5 anos aconteceu em 2010, com 672 dispensas.

O presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder, acredita que as demissões no jornalismo em 2014, sobretudo no impresso, ocorrem por má gestão empresarial. “O patronato faz os trabalhadores pagarem pelos seus erros, seus modelos de negócio equivocados, sua ganância pelos lucros e age orquestradamente, visando amedrontar a categoria e enfraquecê-la na sua capacidade de reação. Os patrões se eximem de qualquer responsabilidade social pelas crises que eles próprios fomentam e pensam cada vez menos na qualidade do Jornalismo que têm a oferecer à sociedade.”

Segundo Schröder, a desculpa para a maioria das demissões é sempre a mesma: economia de gastos e corte de pessoal. “Infelizmente, o jornalismo de qualidade está sempre em segundo plano para as empresas de comunicação. As demissões denotam esse entendimento do patronato, onde o lucro está sempre em primeiro lugar. A Fenaj, junto com seus 31 sindicatos filiados, está de plantão para denunciar os abusos, apoiar os jornalistas que perderam seus empregos e reagir junto com a categoria”, afirmou ele.

 

Passaralhos

Para o professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UNB), Fábio Henrique Pereira, que é membro do Conselho Científico da Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo e pesquisador do Jornalismo em entidades internacionais como a ‘Reseau d’études sur le journalisme’ (REJ) e do Grupo de Estudios sobre la profesión periodística, o mercado de trabalho dos jornalistas tem sofrido mudanças. Para ele, o problema se inicia com o boom de cursos de jornalismo.

“A partir dos anos 1990 houve um aumento acentuado no número de cursos de jornalismo no Brasil. Saímos de 18 em 1970 para 316 em 2010. Hoje são 415 registrados na plataforma E-Mec. E isso tem um impacto no mercado de trabalho. Na minha pesquisa sobre as transformações das carreiras jornalísticas, foi possível perceber como nós passamos de um cenário em que todos os jornalistas saíam empregados da faculdade (vários conseguiam um emprego antes disso), nos anos 1970, 1980, para um cenário de insegurança em que os contratos instáveis ou precários predominam, sobretudo, entre os mais jovens. O índice de absorção dos egressos é baixo, sem falar nas pessoas que abandonam precocemente a profissão”, diz o professor.

Para ele, a proliferação de sites e a criação de novos produtos no ambiente digital permitiu absorver parte da mão de obra jornalística, sobretudo nos anos 1990 e 2000. “Acho que a situação teria sido pior sem a internet. Mas chegamos a um ponto de saturação. A internet sozinha não pode resolver o problema da falta de empregos na mídia tradicional, porque, se por um lado, novas vagas foram criadas no meio online, outras têm sido extintas nas empresas de mídia. Nisso entram os “passaralhos”, mas também a introdução de processos de “convergência” nas redações e que resultam em demissões, na extinção de algumas funções e no de acúmulos de tarefas por um mesmo jornalista”, analisa ele.


Financiamento público

Fábio acredita que é preciso encontrar novas formas para viabilizar a produção de notícias. “Esse é o grande debate que tem sido travado na Europa e nos Estados Unidos. Por exemplo, falam em se criar modalidades de financiamento público para o jornalismo. Na França e em Portugal houve alguns movimentos interessantes de criação de start ups por jovens jornalistas, que tinham mais independência e liberdade para propor soluções criativas para a produção de notícias. No outro extremo, estão grandes conglomerados – algo que não existe no Brasil por conta da nossa legislação – que decidiam manter o setor de notícias mesmo sem dar lucro. A ideia é que manter jornais em funcionamento garante credibilidade à empresa. E eles sempre podem se utilizar dos noticiários como ferramenta de promoção cruzada das demais atrações e serviços oferecidos pelo grupo. Então, você mantém um jornal, mas ganha dinheiro oferecendo acesso à internet ou vendendo merchandising num reality show”, acredita ele.

 

Contratos precários

O professor da UNB acredita que os problemas no jornalismo são recorrentes em vários países do mundo: “Na Europa existe um processo ainda mais forte de precarização do jornalismo. Na França, uma enquete publicada em 2012 mostrou que apenas 36% dos jornalistas com menos de 26 anos possuem um contrato estável de trabalho (o que eles chamam de CDI, Contrat à durée indéterminée). Dentro dos jornalistas com 34 anos, 30% ainda possuem contratos precários de trabalho.

“Na verdade, continua ele, “as pesquisas mostram que as empresas têm prolongado cada vez mais os contratos de trabalho precários porque são incapazes de absorver a mão de obra que sai das universidades (lembrando que lá o diploma não é obrigatório e existem apenas 13 escolas de jornalismo credenciadas). Por outro lado, diferente daqui, depois que se consegue um CDI, existe um pouco mais de estabilidade e é possível fazer carreira numa empresa. No Brasil, os “passaralhos” atingem sobretudo os jornalistas mais velhos e que ganham os melhores salários”.

 

Sem estabilidade

De acordo com pesquisa realizada em 2012 pela professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), Roseli Figaro, que resultou no livro “As mudanças no mundo do trabalho do jornalista”, as transformações ocorridas nos meios de comunicação, por meio das novas tecnologias, principalmente na década de 1990, resultou no aumento no número de jornalistas contratados sem registro em carteira profissional, abrindo espaço a terceirização, contratos de trabalho por tempo determinado, contrato de pessoa jurídica (PJ), cooperados e freelancers.

Na pesquisa, que constatou que a maioria da categoria é composta hoje por mulheres, Roseli observou que, com as novas mudanças no jornalismo, o jornalista não tem estabilidade no emprego e que o mercado guarda muitas incertezas. “Como mão de obra maleável, seja em termos de horário, de jornada de trabalho ou de um vínculo empregatício, esses profissionais não podem planejar suas vidas financeiras e até afetivas”, analisa ela.

A professora constata em sua pesquisa que os jornalistas sabem que uma característica comum na profissão é a rotatividade de mão-de-obra. Para ela, essa troca de emprego pesa nas expectativas do trabalhador. “Se por um lado, a experiência pode enriquecer o profissional, por outro é sempre um começar de novo, um novo que não é tão novo, porque se permanece no mesmo nível hierárquico”.

A pesquisa também revelou que a maior parte dos jornalistas deixou as redações e migrou para as assessorias de comunicação, sejam públicas ou privadas.

Entre os jornalistas pesquisados estão aqueles que têm larga experiência e saíram das redações para coordenar as assessorias de imprensa. O trabalho que exercem em assessorias abastece os veículos de informação e reitera a lógica de produção da notícia a partir de releases, constatou a pesquisadora.

 

Perfil individualista

No que diz respeito ao sentido coletivo, em termos de categoria profissional, Roseli verificou que as novas gerações se sindicalizam menos. Segundo ela, a instabilidade financeira e as dificuldades em se relacionar com o mundo do trabalho não permeiam soluções coletivos como sindicalizar-se ou organizar-se para pleitear melhores condições de trabalho.

“Os jornalistas possuem um perfil profissional deslocado de valores coletivos. São individualistas e muito preocupados com o negócio da profissão. Vão em busca do cliente e consideram a informação um produto.” Ela ressalta, no entanto, que isso não quer dizer que o jornalista não esteja preocupado com causas da coletividade ou da sociedade, mas que há uma busca individual por soluções.

Uma questão que assola o jornalismo são as novas tecnologias. Para a autora, é exigido hoje do jornalista uma atualização constante das ferramentas digitais tanto na apuração como na edição das informações.

Para Roseli, é cada vez mais fundamental o profissional ter flexibilidade nas funções que permitam que ele atue em diversas plataformas, como no impresso, tevê, rádio, internet.

 

Veja a tabela com as homologações:

 

homologaao 10-14

 

Legenda: Trabalhadores pagam pelos erros das empresas, diz Celso Schröder

Foto: Lidyane Ponciano

 

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