A partir das 11 horas do próximo domingo, 26 de outubro, a Praça Memorial Vladimir Herzog passa a contar com um Calçadão do Reconhecimento. A obra consiste em um conjunto de tijolos intertravados com o nome de cada um dos 1.625 contemplados com o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos desde a primeira edição, em 1979, até 2025.
O primeiro tijolo que já compõe o Calçadão é o do jornalista Mouzar Benedito, vencedor da primeira edição do prêmio na antiga categoria Jornal.
No próximo domingo serão instalados mais 44 tijolos representando os destacados na categoria Prêmio Especial, criada em 2009. Trata-se da primeira etapa da obra. Esta distinção é dirigida a jornalistas e personalidades com relevantes serviços prestados às causas da Democracia, Paz, Justiça e Direitos Humanos.
Confira os nomes:
- Mouzar Benedito
- Abdias Nascimento
- Alberto Dines
- Alex Silveira
- Audálio Dantas
- Bernardo Kucinski
- Cláudio Abramo
- D. Angélico Bernardino
- D. Paulo Evaristo Arns
- Daniel Herz
- David de Moraes
- Dom Phillips
- Dorrit Harazim
- Dráuzio Varella
- Eduardo Galeano
- Elaíze Farias
- Elifas Andreato,
- Élio Gaspari
- Fernando Morais
- Flávia Oliveira
- Gizele Martins
- Glenn Greenwald
- Glória Maria
- Hermínio Sacchetta
- José Marques de Melo
- Kátia Brasil
- Laerte
- Lourenço Diaféria
- Lúcio Flávio Pinto
- Luiz Gama
- Marco Antônio Coelho
- Mauro Santayana
- Mino Carta
- Neusa Maria Pereira
- Patrícia Campos Mello
- Perseu Abramo
- Raimundo Pereira
- Rede Wayuri
- Rose Nogueira
- Rubens Paiva
- Sandra Passarinho
- Sônia Bridi
- Sueli Carneiro
- Tim Lopes
- Trabalhadores da EBC
A intervenção que faltava
Na última quarta-feira, 15, durante uma conversa retrospectiva sobre a Praça, Sergio Gomes, diretor da OBORÉ e integrante do Conselho Deliberativo do Instituto Vladimir Herzog, destacou os principais momentos da história de luta e mobilização pela Praça até a inauguração do Calçadão do Reconhecimento, no próximo dia 26.
A instalação da obra coroa a última intervenção prevista no projeto original do artista Elifas Andreato para a Praça, pensado em 2011. No sentido simbólico, ela representa a consolidação do compromisso com os valores defendidos por Vlado e por toda uma geração que lutou pela liberdade, igualdade e fraternidade.
“Ela foi concebida como uma praça Memorial para lembrar a memória do que tinha acontecido com Vlado: da sua prisão, da sua tortura, da sua morte. Mas não apenas isso; também lembrar quais eram os sonhos e os projetos que o Vlado tinha pela democracia, contra a ditadura, por um jornalismo de qualidade”, afirma Sergio Gomes, o Serjão, como é carinhosamente chamado pelos amigos.
Rebatismo
Serjão remontou diversos momentos e organizou as articulações necessárias para criar as condições a fim de este lugar de memória pudesse nascer, no centro da cidade.

No dia 25 de outubro de 2013, 38 anos após o assassinato de Vlado, a Praça, então Divina Providência, é oficialmente inaugurada como Praça Memorial Vladimir Herzog. Foto: João Paulo Brito.
Começou contando que o espaço, atrás da Câmara, era chamado de Praça da Divina Providência. A partir de 2011, com as mobilizações da Comissão Nacional da Verdade, foi instaurada na casa legislativa um comitê na mesma linha a nível municipal. O órgão temporário teve como objetivo esclarecer violações aos direitos humanos ocorridas na cidade de São Paulo durante a ditadura militar (1964-1985).
Como reconhecimento e empenho pela Verdade, o vereador Ítalo Cardoso (PT), então presidente da mesa, fez três propostas à família Herzog, entre elas renomear a praça. Elas estão documentadas na apresentação do Relatório Final da Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog, escrita por Clarice, viúva de Vlado:
“Ali estava o Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Parlamento da nossa Cidade e que nos trazia três propostas: – Batizar de Vladimir Herzog a futura Comissão Municipal da Verdade; – Rebatizar de Vladimir Herzog a linda pracinha que fica na esquina da Rua Santo Antônio com a Praça da Bandeira, em pleno quarteirão da Câmara; – E entronizar ali algumas obras de arte alusivas ao Vlado de autoria do grande Elifas Andreato de sorte que a praça viesse a converter-se num verdadeiro Memorial em Defesa da Liberdade de Imprensa. Claro que dissemos sim. Era uma honra para nós e um reconhecimento da labuta e do empenho pela Verdade e pela
Justiça de tantas e tantas famílias que perderam seus entes queridos”.
O Projeto Memorial
Assim, em 2013, nascia o projeto para o mais novo espaço com o objetivo de proteger a Memória, a Verdade, a Democracia, a Liberdade e a Fraternidade. Em visita à praça em 23 de abril do mesmo ano, Elifas Andreato foi rascunhando no local as obras que iriam constituir o memorial. Amigos da família de Vlado, integrantes do Conselho Deliberativo do Instituto Vladimir Herzog, os vereadores Ítalo Cardoso e Police Neto também testemunharam este momento.

Da esquerda para direita o artista plástico Elifas Andreato, Clarice e Ivo Herzog. Ao fundo, escultura Vlado Vitorioso e Mosaico de cerâmica da tela 25 de outubro, do Elifas. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil (2016).
Neste dia, Elifas definiu que cinco obras ocupariam a praça:
- No paredão da Câmara seria feito um mosaico de cerâmica reproduzindo a tela 25 de Outubro. A tela original, criada em 1981 e exposta no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, retrata o suplício dos que passaram pelo DOI-CODI (Departamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna).
- O nome de todos os ganhadores do Prêmio Vladimir Herzog entrariam à direita do mosaico.
- À esquerda, a relação dos corajosos 1004 jornalistas que publicaram o manifesto “Em Nome da Verdade”, que contestou a versão mentirosa do Exército a dizer que Vlado havia cometido suicídio em 25 de outubro de 1975.
- A reprodução em tamanho natural da escultura Vlado Vitorioso concebida pelo artista em 2008, a pedido da Nações Unidas para comemorar os 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esta ficaria ao centro da praça.
- A réplica do Troféu Vladimir Herzog à esquerda e próximo à Escadaria da Liberdade, que leva à Praça da Bandeira.
Das obras previstas no projeto de Elifas, quatro foram concluídas enquanto o artista ainda estava vivo. Após sua morte, em 29 de março de 2022, ficou pendente a homenagem aos ganhadores do Troféu Vladimir Herzog. Para a execução desta última indicação, Sergio lembra que ficaram um tempo às voltas porque a lista de mais de mil nomes não caberia no local indicado pelo artista.
A continuidade
Entretanto, o encontro com Kleber Pagu, artista e fundador do Museu de Arte a Céu Aberto (CEU), foi fundamental para dar continuidade ao projeto idealizado por Elifas. Em uma visita a uma universidade nos Estados Unidos, Pagu encontra uma referência possível: um pátio com os tais tijolos intertravados com os nomes das figuras importantes da instituição.
“E aí que a gente tem a ideia de que nós vamos fazer no calçadão exatamente naquela ruazinha inútil, que nós iríamos nivelar aquela esplanada, mas não com cimento, não com asfalto, mas com tijolos intertravados”, relembra Serjão.

Kleber Pagu e Cassis Guarniçara durante confecção de dos tijolos. Foto: Frank Oliveira.
Pagu participou também da concepção e instalação do mural “Alguns Personagens Dessa História”, do cartunista Renato Aroeira, inaugurado na Praça em 2024.
O muro do Aroeira e as quatro obras do Elifas, que já ocupam a praça, estão localizadas em um espaço que pertence à Câmara Municipal. O Calçadão, porém, ocupará uma área sob a gestão da Prefeitura, pontua Sergio.
São Paulo tem aproximadamente 5 mil praças públicas, e apenas duas, a Vladimir Herzog e a Paulo Kobayashi, pertencem à Câmara. As demais são de responsabilidade da Prefeitura.
Ocupar, lembrar e sonhar
A realização deste Calçadão concretiza mais um passo na busca pelo direito à Verdade, à Memória e, também, ao futuro.
“Nós fomos perseguidos porque nós estávamos lutando pela Democracia, pela Justiça, pela Liberdade, pela Igualdade, pela Fraternidade. E são esses os valores que nós queremos ver se as novas gerações se afeiçoam a eles e também se dedicam”, defende Serjão.

Foto da edição de setembro de 2025 do Todo Mundo Tem Que Falar, Cantar e Comer – evento mensal que ocupa a Praça todo último domingo do mês. Foto: Jorge Araújo.
Para além de ocupar o espaço com essas obras, a Praça abriga no último domingo de cada mês uma festa democrática: o “Todo Mundo Tem Que Falar, Cantar e Comer”, organizado pelo Coletivo Cultural Associação de Amigos da Praça Memorial Vladimir Herzog. Serjão tem sido seu principal articulador.
“Então, no caso da praça, é uma local que deve reunir artistas, jornalistas, estudantes, economistas, engenheiros, sindicalistas, todo mundo que de alguma coisa, de alguma forma, se identifique com a luta pela Democracia, pela Justiça”, defende Serjão, evocando o ideal da Revolução Francesa – Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Todas as frentes deste evento são democráticas. E tem a frase “quem pode, paga. Quem não pode, pega”, como lema fundante da festa que já completou mais de 30 edições. A atividade entrou para o calendário oficial de eventos da cidade de São Paulo em agosto deste ano, após a Câmara aprovar o projeto de Lei 397/2023, de autoria do vereador Eliseu Gabriel (PSB).
Desde 2023, a Praça é reconhecida como Ponto de Memória pelo Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), e em 2024 ganhou a distinção de Ponto de Cultura pelo Ministério da Cultura.
Serviço:
Inauguração do Calçadão do Reconhecimento
Data: 26 de outubro de 2025, domingo
Horário: 11 horas
Local: Praça Memorial Vladimir Herzog – Rua Santo Antônio, 33, Bela Vista – São Paulo – SP, atrás da Câmara Municipal, em frente ao Terminal Bandeira.
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