Departamento Jurídico do SJSP preparou petição para o Supremo afirmando que a espionagem ilegal de jornalistas pode ferir o direito constitucional ao sigilo de fonte
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP), juntamente com a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), protocolou no dia 23 de fevereiro, sexta-feira, um pedido ao Supremo Tribunal Federal de divulgação dos nomes dos jornalistas que foram espionados ilegalmente pela chamada ‘Abin paralela’.
O esquema criminoso de monitoramento de jornalistas, autoridades públicas e políticos se tornou público no dia 25 de janeiro quando a Operação Vigilância Aproximada, realizada pela Polícia Federal, executou 21 mandatos de busca e apreensão em endereços ligados aos suspeitos de fazerem parte de uma estrutura paralela dentro da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, durante o governo Bolsonaro.
Thiago Tanji, presidente do Sindicato dos Jornalistas no Estado de São Paulo (SJSP) explica que decidiu-se entrar com esse pedido porque ao tomar conhecimento da investigação que escancarou a história de uma “Abin Paralela” a serviço do governo Bolsonaro para espionar ilegalmente opositores, políticos e jornalistas, se entendeu que é fundamental que essa história seja esclarecida e que se conheça a extensão do número de jornalistas espionados. ‘Com isso, teremos a dimensão dos crimes cometidos pelo governo Bolsonaro em relação a aparelhar o Estado para seus intentos criminosos, antidemocráticos e que claramente buscavam a perpetuação do seu poder’, completa Tanji.
Dentre os objetivos do pedido de divulgação dos nomes dos profissionais de comunicação que foram espionados, estão também poder compreender por quais motivos eles foram ilegalmente espionados e qual era o objetivo das pessoas envolvidas nessa arapongagem. ‘Certamente o objetivo era ter acesso às fontes de informações desses jornalistas, e se isso se comprova é uma grave violação ao direito constitucional do sigilo da fonte’, destaca Samira e Castro, presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ).
Para Octávio Costa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), as atividades da Abin Paralela foram ilegais e criminosas e um ostensivo ataque à liberdade de imprensa. ‘O objetivo da espionagem e das escutas era um só: intimidar jornalistas que apontavam os crimes e os abusos do desgoverno Bolsonaro. Ao quebrar sigilo das fontes e fazer devassa nos dados pessoais, o que se queria era ameaçar e calar os profissionais de imprensa. E sem imprensa livre não há democracia, enfatiza Octávio.
O embasamento jurídico do pedido se dá essencialmente nesta questão do direito constitucional ao sigilo à fonte no exercício do fazer jornalístico, bem como o direito à privacidade de todo cidadão brasileiro. Este não é o primeiro pedido ao STF de divulgação da lista de espionados na “Abin Paralela’, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco já solicitou a divulgação dos nomes de parlamentares, assim como o Grupo Prerrogativas também pediu a divulgação da lista completa, mas ao que diz respeito exclusivamente à violação ilegal do sigilo de jornalistas, esse é o primeiro documento que se tem conhecimento.
Para o presidente do SJSP, a utilização de maneira ilegal e abusiva de serviços de espionagem é uma clara tentativa de violar o livre exercício jornalístico e o sigilo à fonte. ‘Não é impossível que o governo Bolsonaro tenha buscado saber quais eram as fontes dos jornalistas antes da publicação de reportagens com assuntos que tinham relação com o governo. Como já sabemos que jornalistas foram espionados, é impossível não fazer esse tipo de associação. E acreditamos que, ao abrir as informações e sabermos a dimensão do número de profissionais ilegalmente espionados, poderemos precisar o dano causado pelo bolsonarismo à democracia, à livre circulação de informações e ao livre exercício profissional de nossa categoria’, comenta Thiago.
Essa não é a primeira vez que ações do Governo Bolsonaro e seus aliados violaram os direitos dos profissionais da comunicação. Samira, relembra o inquérito 4874, que trata das milícias digitais. Nele se empreende a tese de que o ex-presidente Jair Bolsonaro, atentou contra a liberdade de imprensa, e buscou, durante seu governo, desacreditar o trabalho jornalístico como estratégia inicial de atacar as instituições. ‘Nesse sentido, a existência de uma ‘Abin Paralela’ que espionava e jornalistas, corrobora com a tese de que esses profissionais eram monitorados para alimentar o gabinete do ódio, e esse gabinete, por sua vez, para fazer o trabalho de desacreditar na imprensa profissional juntamente com o próprio Bolsonaro, seu filhos políticos, seus ministros e seus assessores. Então a gente vê uma forte ligação nisso tudo e é preciso que essas informações venham à tona, para que a gente possa compreender como operava todo esse esquema e qual era o objetivo dessas pessoas em atacar a liberdade de imprensa.’, pontua a presidenta da FENAJ.
Desdobramentos
Espera-se que a possível divulgação da lista de jornalistas vítimas da arapongagem exercida ilegalmente possa acarretar a responsabilização das pessoas envolvidas no ato criminoso e que atenta à constituição, como comenta Samira de Castro, ‘Uma eventual espionagem paralela da Agência Brasileira de inteligência caracteriza uma afronta as prerrogativas dos jornalistas, como a garantia do livre exercício profissional, a liberdade imprensa e do sigilo da fonte. É por isso que essas entidades estão entrando com esse pedido de informação, para compreender e salvaguardar – no sentido de que não ocorra mais atos como estes- os direitos constitucionais que posso ter sido maculados com essa espionagem paralela.’
Outra possibilidade, neste sentido, é a responsabilização da União pela violação de direitos destes profissionais da comunicação, como destaca o advogado Raphael Maia, da coordenação do departamento jurídico do SJSP e responsável pela elaboração da petição enviada ao STF. ‘É muito grave a possibilidade de que jornalistas possam ter sido espionados de forma ilegal, colocando em risco a garantia profissional do sigilo das fontes. Caso as suspeitas se confirmem, a União deverá ser responsabilizada civilmente pela violação das prerrogativas profissionais e da intimidade dos jornalistas espionados.’
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