O Tribunal Superior do Trabalho (TST) vai avaliar a alteração de súmulas para adequá-las ao conteúdo da reforma trabalhista (Lei no 13.467, de 2017), que entrou em vigor no dia 11 de novembro do ano passado. A sessão para analisar o tema está marcada para o início de fevereiro.
Súmulas são orientações criadas para balizar os votos dos ministros e as decisões do tribunal em julgamentos sobre diversos temas. Esses enunciados são elaborados a partir de decisões semelhantes ocorridas na Justiça do Trabalho em suas várias instâncias e funcionam como referência quando não há lei ou esta não é clara sobre algum aspecto.
As recomendações foram elaboradas pela Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do TST e aprovadas em duas reuniões, em 11 de outubro e 10 de novembro de 2017. Elas envolvem 34 súmulas do tribunal.
Uma parte das propostas se limita a incorporar as novas regras determinadas pela reforma trabalhista. É o caso da Súmula 90, segundo a qual o tempo de transporte com veículo da empresa, para local de difícil acesso ou não servido por transporte público, fica computado na jornada de trabalho. A Lei retirou essa garantia. A recomendação é incorporar a alteração.
Outro exemplo é a possibilidade de incorporação de gratificações concedidas por mais de 10 anos, assegurada pela Súmula 372 mas extinta pela reforma trabalhista na nova redação dada ao Artigo 468. Neste caso também a Comissão sugeriu a revisão do enunciado respeitando o novo parâmetro.
Contratos novos X antigos
Uma das principais reflexões presentes nas propostas é se as novas regras da reforma se aplicariam aos contratos já existentes quando ela entrou em vigor, em 11 de novembro, ou somente pra aqueles celebrados depois desta data. O entendimento em vários casos foi pela validade das novas regras apenas nos contratos novos, preservando o direito adquirido dos trabalhadores.
No dia 14 de novembro, o governo federal editou a Medida Provisória 808, afirmando de maneira expressa que a Lei no 13.467 “se aplica, na integralidade, aos contratos de trabalho vigentes”. Ou seja, as regras não seriam apenas para os contratos a partir de 11 de novembro, mas também seriam levadas em consideração em processos judiciais ajuizados antes mesmo da entrada em vigor da reforma.
A análise a ser feita pelo pleno do TST, portanto, terá que incluir também a possibilidade dessa determinação. A MP ainda não foi convertida em Lei e pode não ser efetivada pelo Congresso Nacional.
Conflitos legais
O objetivo do governo com a Media Provisória 808 foi dirimir dúvidas e impor sua validade aos contratos vigentes. Contudo, juristas apontam conflitos desse dispositivo com outros existentes na Consolidação nas Leis do Trabalho e na Constituição.
Na avaliação do advogado Max Garcez, da Associação Latino-americana de Advogados Trabalhistas, as garantias previstas na Carta Magna (especialmente no Artigo 7°, que trata dos direitos trabalhistas) associadas ao princípio do não retrocesso impediriam a aplicação das regras aos contratos vigentes em 10 de novembro do ano passado e às ações ajuizadas antes desse dia.
“Seria inconstitucional. Você não pode mudar as regras do jogo. Trabalhador tem garantias anteriores incorporadas ao contrato de trabalho, como previsto no Artigo 468 da CLT, e este não foi revogado. Além disso, já há jurisprudência no Supremo Tribunal Federal no sentido de impedir retrocessos como este”, defende Garcez.
Guilherme Feliciano, presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), também defende que não é possível usar as regras para os contratos em vigor no dia 10 de novembro pelo princípio da condição mais benéfica. Mas isso deverá ser melhor discutido uma vez que a comissão de jurisprudência trabalhou com a ideia de “garantia de direitos adquiridos”, mas não deixou claro o que isso significaria.
Para além desse conflito, o presidente da Anamatra se preocupa com o ajuste dessas súmulas sem esperar julgamentos nas instâncias inferiores na Justiça do Trabalho, de modo a formar uma base de jurisprudência.
“A Comissão recomendou ajuste a textos da reforma que ainda admitem algum dimensionamento a partir dos julgamentos que vão ser realizados. Trabalhadores do ramo de limpeza e que estão sujeitos a algum tipo de sujeira, por exemplo. A higiene pode se considerar tempo privado do trabalhador ou da empresa?”, questiona Feliciano, se referindo à nova regra segundo a qual essas atividades consideradas “tempo privado” poderiam ser descontadas da jornada de trabalho.
Fonte: Agência Brasil