A Lei é mais do que clara: as empresas têm a obrigação de pagar os salários de seus empregados, havendo ou não lucro, estando ou não em crise. Essas verbas têm natureza alimentar e devem ser quitadas, independentemente da saúde econômica e financeira do empregador. Com base nessa assertiva, o Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo (SJSP) decidiu entrar na Justiça para buscar o pagamento dos salários dos trabalhadores da Editora Três – que edita as revistas ISTOÉ, ISTOÉ Dinheiro, Motor Show e Dinheiro Rural –, que há três anos vêm sofrendo com o descumprimento no prazo de pagamento dos salários. O atraso acumulado chega a quatro meses. Ou seja, quase no fim de setembro, os funcionários aguardam o pagamento dos vencimentos referentes a maio. “A situação passou de qualquer limite, e está insuportável para os profissionais”, afirma Paulo Zocchi, presidente do SJSP.
Em decorrência dos atrasos, muitos funcionários já não têm condições de se deslocar para trabalhar ou de pagar pelo próprio almoço. Há relatos de funcionários que estão enfrentando processos de despejo de suas moradias em razão de aluguéis atrasados. Outros foram recusados em consultas médicas e pronto-socorro por atrasos nos pagamentos dos convênios médicos – entre os poucos que ainda são CLT. Atualmente, mais de 90% dos jornalistas são precarizados pelo sistema de PJ, uma fraude trabalhista contra a qual o Sindicato luta há anos. Além disso, as pessoas demitidas estão simplesmente tomando o calote.
A Editora Três é contumaz descumpridora de acordos e de direitos trabalhistas. Nos últimos meses, a situação piorou. “A empresa não cumpre sequer os acordos judiciais que assume nos tribunais. Hoje, temos inúmeros processos que não estão sendo pagos”, afirma Raphael Maia, advogado da entidade. A lista de irregularidades na Editora Três é enorme. A empresa não pagou o FGTS de 2018, não deposita o FGTS dos funcionários, não paga horas extras e frauda o vínculo empregatício de dezenas de jornalistas. “Já que as negociações com a empresa não são cumpridas, temos que avançar na organização dos jornalistas e outros profissionais e também buscar todos os meios legais para a reparação das irregularidades”, diz Zocchi. “É hora de dar um basta a isso. Os trabalhadores, que cumprem corretamente todos os seus deveres, não podem ser tratados desta forma desumana”, declara o sindicalista.
A Editora Três, que recentemente suspendeu a impressão das revistas Planeta e Menu, mantém os títulos ISTOÉ, Dinheiro e Dinheiro Rural. A MotorShow está sem circular desde agosto por falta de pagamento à gráfica. “O silêncio da empresa diante de tantas questões ainda é mais revoltante”, diz Zocchi. “Ninguém sabe se a empresa está em processo de falência ou venda, mas falta total de recursos não é. Sabemos que tem entrado muita receita nos cofres da empresa, em ações como o projeto ‘As Melhores da Dinheiro’, um ranking de empresas brasileiras e um evento que recheia os cofres da editora. A falta de responsabilidade e respeito com os funcionários, com os acordos judiciais já feitos e com o pagamento de obrigações é de provocar profunda indignação. O sentimento dos jornalistas que trabalham na empresa é de grande insatisfação e apreensão”, afirma.
A decisão do Sindicato de entrar com a ação foi ao encontro de iniciativa adotada pelo Ministério Público do Trabalho, que já está em trâmite. Decisão recente atesta situação denunciada há anos pelos trabalhadores e pelos sindicatos, e determina à empresa que pague os salários e o FGTS em atraso, sob pena de multa a ser revertida para o Fundo de Amparo ao Trabalhador. Como a sentença ainda está na fase de recurso, o Sindicato deverá se somar à ação, para reforçá-la e tentar ampliar suas chances de sucesso. O objetivo é fazer com que essa ação possa ser um instrumento para ajudar os funcionários (contratados ou não) da Editora Três a conseguirem garantir o respeito pleno a todos os seus direitos.